19.Islândia-Ilhas Faroé-Noruega

– Fim de dia 

17 de agosto de 2019 (continuação)

Quando reservei as passagens para os ferries, havia a possibilidade de desembarcar nas Ilhas Faroé por 3 dias, o tempo que o ferry seguinte voltaria a passar, dado que as ilhas têm varias ligações à Dinamarca pois são uma região dependente dela. Cheguei a ponderar essa hipótese, sabendo que o arquipélago não é muito grande, por isso em 3 dias conseguiria ver muita coisa. Se pensarmos que o arquipélago tem uma área total inferior a qualquer distrito português, é fácil imaginar o quanto se pode visitar num distrito nosso em 3 dias!

No entanto, depois de ponderar bem, achei melhor ficar por 7 dias, até voltar a passar o ferry da Islândia, podia encontrar mau tempo, ter algum impedimento ou percalço e não conseguir ver nada nos tais 3 dias… e fiz bem!

Ali encontrei o casal de Malta, que embarcara comigo na ida e no regresso da Islândia e que tinha seguido essa opção, de ficar os tais 3 dias nas Ilhas e, coitados, estavam fechados do hotel desde que chegaram, apenas caminhando um pouco por Torshavn, saíram pela primeira vez de moto para irem até ali e apanharam tudo submerso em nuvens e nevoeiro. (é o que dá acordar tarde e gastar o tempo todo a tomar pequenos almoços em hotéis)

Estavam inconsoláveis pois iriam partir no dia seguinte de manhã, (pois os três dias, na realidade, não eram mais que dois dias e umas horas) e nada tinham visto das ilhas, foram até lá só para pagar fortunas para ficarem dentro de um quarto de hotel, sem paisagem, sabendo que há um mundo de belezas incríveis à espera, algures, inacessíveis a eles.

Eu é que fora inteligente, disseram eles, que tinham ficado com pena de mim por eu me ter disposto a acampar tanto na Islândia como nas ilhas, pois eles esgotaram rapidamente o orçamento da viagem em hotéis estupidamente caros para nada verem!

Pois, eu vira isso em casa, por isso optei pelo campismo. A diferença de preços nas ilhas era de 75€ por noite, no hotel mais barato para 12€ por noite no camping! Fácil a escolha, não? Ainda por cima os hotéis mais baratos esgotaram muito cedo e tão rapidamente que nem tive tempo de ponderar mais. A dois meses da minha partida já não havia qualquer quarto disponível a nenhum preço em todo o arquipélago. Então eu peguei na minha casa e vim monta-la na ilha.

E lá iam eles, todos miseráveis embora, levando como memória das ilhas toda a chuva e nevoeiro que viram…

Subitamente eu já nem me lamentava pela nevoa e chuva, tinha ainda tanto tempo para ver o que quisesse que, mesmo que chovesse, algo se revelaria antes de eu partir, dali a dias, yesss!

Eles acabaram por ficar algures no meio do percurso a conversar com outro motociclista que fizera a mesma escolha que eles e partiria no dia seguinte. Esse ainda saiu mais tarde do hotel e já nem o lago iria ver. Senti-me uma privilegiada por ter mais tempo. O outro motociclista nem me dirigiu a palavra, apenas comentava como fora estupido em não ter feito as coisas de outra maneira e lamentava o dinheiro que estava a gastar nas ilhas sem as ver.

Temos pena, amigo! Agora já não sou a miserável que acampa para gastar menos dinheiro, olha para mim e chora!

E lá fui eu passear pelos caminhos mais manhosos que encontrei, para ter outras perspetivas da paisagem e só porque o podia fazer!

Já que a paisagem estava meio encoberta, que eu a visse de ângulos criativos!

Comparando com outros caminhos que fiz na Islândia, aquele era bem simpático de fazer.

Ainda havia muita coisa que eu queria ver na ilha de Vagar. Provavelmente o tempo não me permitiria grande visibilidade, mas eu continuaria para a frente de qualquer maneira, afinal o meu uniforme mantinha-se: tudo vestido com o fato de chuva por cima, logo não haveria chuva que me assustasse!

Quanto ao nevoeiro, paciência, só me restava esperar que conferisse a cada paisagem um clima romântico de mistério e que não tapasse tudo! E a verdade é que havia algo cinematográfico ou teatral nas paisagens, graças à névoa!

Santo Deus, não era possível seguir conduzindo sem parar a cada quilómetro para apreciar o que me rodeava!

Eu sabia que nem todos os percursos são circulares naquelas ilhas, grande parte das vezes somos obrigados a voltar para trás pelo mesmo caminho, pois não há seguimento, mas mesmo assim, como nada me garantia que ao voltar houvesse visibilidade, eu parava aqui e ali e mais além e… enfim, tinha o dia todo para isso, que se lixe, paro onde e quantas vezes quiser!

Tinha passado por dois motociclistas a fazer o mesmo caminho que eu. Não sei porquê, mas não eram muito simpáticos.

Frequentemente isso acontece comigo, passo por motociclistas que me cumprimentam com sinais em “V”, eu também cumprimento sempre. De alguma forma sente-se alguma simpatia quando nos cumprimentam, é natural. Seguimos caminho perto uns dos outros, porque, na realidade, estamos a ir para o mesmo lugar e é como se por momentos estivéssemos a viajar juntos. São sempre momentos bonitos… até pararmos!

Depois de uma certa afinidade ao conduzirmos juntos seria de esperar dois dedos de conversa, alguma simpatia, sei lá! Mas nem sempre é assim…

Paramos as motos perto e a empatia quebrou-se assim que tirei o capacete! Eu já vi este filme varias vezes, noutras viagens, assim que percebem que eu sou uma mulher parece que ficam desorientados e não sabem falar comigo. Não entendo se se sentem intimidados, se ameaçados, não sei se pelo facto de eu ser uma mulher sozinha a andar por ali os incomoda… sei que se afastam e fazem de conta que eu não existo!

Enfim, é para o lado que eu durmo melhor, não preciso de companhia, e quanto menos tempo perder com parvoíces, mais coisas maravilhosas vejo e sinto!

Podia ver Tindhólmur, a ilhota magica com rochedos delumbrantes, meio escondida na bruma e isso era mais importante do que motociclistas carrancudos.

Uma pena, seguramente não a iria ver de perto.

Sabia que há barcos que nos levam até ela, em passeios por entre rochedos de formas curiosas, mas com aquela nevoa envolvendo tudo teria de deixar para outra vez… uma pena!

Segui para Gasadalur, uma aldeia rodeada pelas montanhas mais altas de Vagar. Que coisa linda!

As casinhas atraíam-me tanto! Se pudesse tinha entrado para ver como eram por dentro.

Os meus “colegas” de estrada foram diretos à cascata. A mim não me apeteceu ir lá, não naquele momento.

Eu queria ver os pormenores da aldeia, com as casinhas de turfa e os pequenos terrenos cultivados.

Um pormenor à entrada da aldeia!

Sølubúð, as voltas que eu dei para entender o que aquilo queria dizer! Acabei por conseguir traduzir de faroês para espanhol, pois para português estava difícil. E quer dizer “tienda” ou loja! Ao que parece os residentes põem ali suas coisas para outras pessoas usarem e pagarem por elas, havia descrições em inglês de produtos que costumavam estar à venda e estavam “out of stock” como bolinhos e coisas afins.

O nevoeiro aproximava-se e descia rapidamente, se eu queria ver a cascata de Múlafossur teria de me apressar!

Tindhólmur, a ilhota dos 5 picos estava quase invisível… Ok, tivera azar com a nevoa e a pouca visibilidade, mas tinha de admitir que ganhara perspetivas românticas e de mistério únicas! Há que ver a beleza do momento e nunca a perder gemendo pela beleza que poderia ter sido!

Não me apressei, caminhei pelo percurso demarcado com fitas. Curiosamente o piso era de relva tão espessa que parecia uma alcatifa grossíssima, que nem os muitos pés que por ali passavam tinham conseguido desbastar!

“Depois dos rochedos e dos recortes na falésia, fica a catarata, e no entanto foi a aldeia de Gasadalur e a envolvência que prendeu minha atenção! Não havia ninguém, apenas eu e os aldeões, que me olhavam com curiosidade, a bruma aproximava-se e rapidamente cobriu tudo, e eu não me importei. Apenas não me apeteceu percorrer correndo a distancia entre toda a beleza que me fascinava e a catarata, só porque “é obrigatório” lá ir! E vi pessoas chegarem, irem rapidamente até lá e partirem de novo… mas aparentemente eu não sou igual às outras pessoas e não tenho os mesmos objetivos!” (in Passeando pela Vida – a Página)

Não tenho vertigens, também não tenho atração pelo abismo, mas estas falésias sempre me fazem arrepiar e me provocam momentos de quase paralisia de êxtase.

É claro que eu hoje me arrependo um pouco de não ter ido ver a cascata, podia ter lá ido antes de o nevoeiro ter tapado tudo, e voltado para explorar a falésia depois. Mas não me apeteceu correr no ir e voltar… um dia volto lá e vejo e pode ser que até encontre céu e sol aberto!

Pelo que percebi a população da aldeia é de 11 pessoas! Não admira que se ouça e se leia que os faroenses stressam com o volume de visitantes, não é preciso muita gente para parecer uma multidão em aldeias de 11 habitantes, com uma das paisagens mais espetaculares e “instagraveis” do mundo!

Uma questão que eu me punha, sobre como são aparados os telhados das casas, e que descobri a resposta. É simples, colocam uma ovelha em cima e ela encarrega-se disso! Fantástico, ecológico e eficaz, quem pode querer melhor solução? Afinal estamos na terra onde o volume de ovelhas é o dobro do volume de habitantes! Por isso elas têm tanto ao mais direito a usufruir dos recursos!

E realmente a relva dos telhados parecia sempre aparada, nunca a via crescida a ponto de pender nas bordas. A ovelhas por ali são eficientes.

Um dia questionei-me se na Noruega, dado o clima e a latitude, não haveria vacas cabeludas como na Escócia. E sim, quando passeei pelo país, encontrei-as alegres e contentes pastando. Na altura fiquei eufórica, parei a moto e fui para o meio de pasto observa-las e fotografa-las.

Um outro dia, observando o mapa das Ilhas Faroé e a sua “proximidade” da Escócia, voltei a questionar-me se as famosas vaquinhas não estariam por lá também, sei lá, eu nem sou especialista em vacas e tenho algum receio delas (tenho sempre que um bicho é maior do que eu e a minha moto e pode atirar connosco ao chão!) mas apenas me questionei!

E lá estavam elas, no meio da bela pastagem verde, com as franja a tapar-lhe os olhos!
Não me contive e dei gargalhadas de satisfação! São tão fofinhas e simpáticas!

Há quem lhes chame vacas escocesas, eu há muito deixei de as chamar assim, por respeito às primas norueguesas e agora às vizinhas feroesas!

Ali é o fim da linha, não há caminho para a frente, por isso tem de se fazer o mesmo caminho de volta.

É os rochedos estavam ainda mais encobertos, apenas me restava vê-los de longe e seguir caminho.

Ainda que as ruas sejam as mesmas, olha-las na perspetiva inversa é sempre interessante e dei comigo a parar no mesmo sítios da ida, apenas porque eram muito bonitos vistos em todas as direções!

Lá estava Bøur ao fundo. naquele país todas as terras têm seu próprio mar, sua própria baía, ninguém está longe da água!

Na realidade dizem que nenhum ponto no arquipélago está a mais de 5 quilómetros do mar, isso é algo de espantoso! Caso para dizer que o mar é mesmo de todos por ali!

Bøur é uma aldeiazinha fofa, entre a curva do monte e a curva do mar, que tem 74 habitantes, dizem. A mim pareceu-me que tem mais casas do que pessoas!

Não desci, a vida ensinou-me que grande parte das aldeias com enquadramentos bonitos à distância, estão a mostrar a melhor perspetiva de si, pois de perto são bem mais banais. E por ali não era diferente e eu sentia quando eram muito parecidas com o que já vira!

“As Ilhas Faroé foram a bonança depois da tempestade! Depois do percurso exigente na Islândia, deixar deslizar a moto pelos caminhos deslumbrantes de paz, com o verde a emoldurar magnificamente cada quilómetro, era tudo o que eu precisava. Mesmo com a bruma e a visibilidade reduzida, o mistério e o deslumbramento fizeram-me tão bem, como o desfolhar calmamente de um livro de viagens no conforto de um lar…” (In Passeando pela Vida – a Página)

Sørvágur, uma das mais antigas aldeias das Ilhas Faroé. Nos anos 50, ao construírem uma nova escola, descobriram um antigo assentamento Viking.

Durante a Segunda Guerra Mundial ali se alojaram os engenheiros britânicos que construíram toda a infraestrutura da vila bem como o Aeroporto de Vagar, o porto em Sørvág e diversas estradas e pontes. Para isso, eles tiveram de mover casas inteiras para outros locais! Acho que é a vantagem das casas de madeira, embora se movam também casa de pedra e cimento armado, para além de manterem melhor o calor no interior.

A Sørvágs kirkja, igreja do séc. XIX, é a coisa mais proeminente na vila para quem chega. É preta, tem muito espaço em volta e um cemitério em seu redor, dentro de um muro de pedras irregular. Claro que me chamou a atenção, mas estava fechada…

Sandavágur estava já debaixo de um espeço nevoeiro, se não a tivesse visto na ida, seguramente na volta não a veria, pelo menos não a partir da estrada!

Mas mesmo assim deu para ter outras perspetiva lá em baixo, mais de perto, só para ver como era o mar de areia negra com todo o nevoeiro.

E era curioso o conjunto, como se eu estivesse no meio de uma foto a preto e branco.

Acho que entendi porque a igreja é branca e vermelha, é para as pessoas a encontrarem no meio de cinzento dos dias de nevoeiro! ahahahah

Parece que à minha aproximação o céu se abria um pouco, só para eu não fazer troça da falta de cor na paisagem, e ver como o verde ainda era verde por todo o lado!

E sim, aquilo é bonito de qualquer maneira!

E lá fui seguindo para casa, apreciando o que me era permitido no meio da nevoa, em paisagens sempre arrebatadoras, com baias negras e montes verdes em todo o lugar!

Eu já me habituara tanto à falta de arvores, que apenas olhava em redor e pensava, por não existirem é que se podia ver toda a beleza dos montes, como campos de futebol que sobem e descem infinitamente!

E depois há as cataratas, os regos de água e as nascentes, por todos os lados, sem nem haver filas de turistas para as ver, porque são tão frequentes e banais que se passa por elas quase sem dar importância! Eu iria perceber com a continuação das explorações o quanto isso era banal e verdade!

A falta de sol começava a fazer-se sentir no meu ânimo. A combinação de frio e nevoeiro é deprimente e não havia nada que eu pudesse fazer contra isso!

Mesmo assim, o passeio daquele dia fora muito produtivo e nem por isso molhado, não tinha do que me queixar quanto a isso.

Tomei um banho quente, por ali é fácil levantar moedas para o banho com cartão multibanco, e fui-me juntar aos mochileiros que tomavam café no banco em cima do muro de relva, junto à minha tenda. Não chovia, mas o tempo arrefecia rapidamente. Estávamos todos equipados como esquimós e gordos de tanta roupa que vestíamos. Ainda demos boas gargalhadas pelo serão, até gelarmos totalmente e voltarmos para as nossas casa.

Foi tão bom dormir quentinha, com o corpo relaxado, porque não foi puxado ao limite naquele dia…

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