41. Passeando por caminhos Celtas – Passeando pelos Picos da Europa

31 de agosto de 2014

Eu queria tanto ficar ali por muitos dias…

O albergue fica no extremo do penhasco onde fica o pueblo, acima dos 1000 metros de altitude e com o precipício tão perto quanto deslumbrante. Podem-se ver algumas casas da aldeia mais à frente e apetece ficar, relaxar, aproveitar o tempo para escrever um pouco, talvez desenhar…

Mas não dava mais, eu tinha de partir, o mês de agosto estava a chegar ao fim e no dia seguinte eu iria para casa. Felizmente o tempo ajudava, com um sol radioso e uma temperatura amena, que desceria a pique ao anoitecer, mas tudo bem.

A cada vez que passo eu visito os Pico da Europa e, à semelhança do que faço em sítios onde passo muitas vezes, escolho uma parte diferente para passear e, desta vez, a minha estadia em Sotres tinha como intensão levar-me a reviver caminhos que não fazia há tanto tempo! Há tanto tempo que ainda os fiz de Africa Twin, percorrendo trilhos e catando caminhos cheios de beleza.

Sem uma trail eu não poderia meter-me por trilhos, mas podia explorar ruelas em caracol a pique que eu conhecia e era o que eu estava determinada a fazer: levar a minha motita até ao topo dos montes e rever picos que são para mim “velhos amigos”.

E sem querer ir muito longe, apenas me deixando ir, a quantidade de coisas que eu veria naquele dia!

No albergue estava alojado um motard que meteu conversa comigo na noite anterior. Era espanhol, já não me lembro de onde, e não queria ir a lado nenhum, não gostava de nada do que eu gosto, não via interesse nas coisas que me moviam e apenas viera até ali para fazer quilómetros.

Fiquei a vê-lo preparar-se para partir, imaginando o que eu faria naquele dia se tivesse a moto dele à minha disposição!

Eu não tinha pressa nenhuma, tinha o dia inteiro para passear e a minha motita leve e sem tralhas para me acompanhar, tudo o que eu precisava para ser feliz!

Apenas o caminho desde Sotres até ao mundo real cá em baixo já era um deslumbramento em cada curva!

Difícil seguir quando o que apetece é parar e fotografar cada pedaço de caminho!

Então, de entre as ruinhas sem pavimento, lá apareceu a que eu queria, estreitinha, cheia de curvas e com um piso aceitável para a minha bonequinha poder subir!

Era a estrada do paraíso!

Com uma sequência extraordinária de curvas em cotovelo a inspirar a condução!

Então eu vi-o!

Parei a moto mesmo ali e fiquei a aprecia-lo!

Ao tempo que eu não via o Naranjo de Bulnes e lá estava ele, imponente e tão visível como poucas vezes está!

Sentei-me na moto e desenhei…

Ali acima fica um mirador. É tão bom caminhar por tão impressionantes caminhos sem um milhão de turistas a perturbar o silêncio!

Como um altar onde se pode venerar a natureza, é o que aquele, e outros miradores por ali são!

Deslumbrante!

“O Urriellu Picu, ou Naranjo de Bulnes, é aquele pico extraordinário no coração dos Picos de Europa que se impõe, como se de gente se tratasse, sobre nós! Majestoso, não é o ponto mais alto daqui da montanha, mas é seguramente o mais mítico. E basta olhar para ele para se entender porquê. Fiquei ali a olha-lo como se fosse a primeira vez que o via. A montanha sempre tem esse efeito sobre mim. Tenho de o rever amanhã, antes de me ir embora, em tom de despedida.”

(in Passeando pela vida – a página)

Simplesmente não conseguia tirar os olhos dele!

E voltei a desenhar!

Que tempo inspirador estava! Um céu azul intenso sempre inspira para fotografar e desenhar!

Inspiração para explorar caminhos duvidosos mas que a minha bonequinha ainda vai conseguindo fazer!

E quando se vai aos Picos há sempre um ou dois pontos de passagem obrigatória!

Covadonga, uma rápida passagem, só para ver se está tudo no mesmo sítio!

Pelayo, o primeiro rei das Asturias, a quem chamam o primeiro rei de Espanha!

Ainda espreitei na igreja mas é proibido fotografar e quando me proíbem de fotografar a vontade que tenho é de voltar as costas e sair, e foi o que fiz!

“Diz a lenda que Nossa Senhora de Covadonga ajudou Rei Don Pelayo a vencer os mouros que atacavam e dominavam o norte de Espanha com um exército muito superior ao seu. Pela sua fidelidade e fé, Pelayo recusou-se a submeter-se e estava condenado a ser vencido, quando a terra tremeu e se abriu e engoliu boa parte do exército inimigo! Ele foi coroado rei das Astúrias, o primeiro e o seu quartel-general durante os tempos conturbados de guerras foi a gruta “suspensa nos rochedos”, onde hoje está a capelinha da Senhora de Covadonga. Olhando da rua, a capela ela lá em cima, numa reentrância escavada na montanha escarpada e vê-se o movimento permanente das pessoas que fazem filas para a visitarem e rezarem. Ali começou a reconquista da Península Ibérica aos Mouros, estávamos no início dos anos 700, bem antes da nossa nacionalidade!”

(in Passeando pela vida – a página)

Outro ponto de visita obrigatória é Cangas de Onis, com a sua igreja tão característica e o monumento a D. Pelayo na frente!

Ali não havia impedimento a fotografias. Eu nunca entendo muito bem porque não é permitido fotografar o interior de determinadas igrejas, parece que uma foto rouba algo ao monumento! Desde que não se use flash, nada se perde numa foto!

A igreja é recente, de meados do séc XX, e é consagrada a Nuestra Señora de la Asunción.

E logo ali fica o mercado que estava cheio de vida e de coisas boas!

Oh, o que eu me fartei de comer por ali enquanto catava todos os recantos e bancadas! Aquela espécie de empadas e bôlas de carne e de tudo, acompanhadas por uma boa cerveja, com uns pedacinhos de queijo que me iam oferecendo para eu provar, foi uma alegria!

Depois veio a ponte, tinha de vir! Incontornável a visita! Não sei quantas vezes já a visitei, nem quantas vezes já subi ali acima, mas naquele dia eu estava particularmente interessada em ficar um pouco junto dela.

Acontece-me frequentemente ao chegar a casa sentir que devia ter aproveitado mais um momento e, ao voltar a passar, corrijo o erro! E foi o que fiz, sobretudo porque queria fazer alguns desenhos e, da última vez que ali estive não estava sozinha, por isso não pude faze-lo!

De cima da ponte a paisagem é interessante! Ninguém imagina que a ponte é tão alta e que se consegue ver tão longe lá de cima!

Eu iria explorar aqueles lados a seguir, o Camin da la Reina, depois de explorar melhor a redondeza da ponte!

Aos pés da ponte há rochas com fartura para a gente passear, que estão frequentemente repletas de gente a fazer poses para a fotografia, com a ponte como cenário de fundo. Típico!

“Chamam-lhe ponte Romana mas ela denuncia traços posteriores, pode ser uma remodelação/reconstrução de uma ponte anterior e daí venha o seu nome! A Puente Romano de Cangas de Onís é como que o ex-libris da cidade, impossível passar e ficar indiferente! Da última vez que lá passei dei-me ao requinte de a viver bem de perto, passei-lhe por cima, desci ao rio Sella, passeei-me por baixo, pelos rochedos acessíveis, e admirei os seus encantos em todos os ângulos. É uma ponte admirável num ambiente encantador!”

(in Passeando pela vida – a página)

Mas eu queria ir para o outro lado, o lado que ninguém vê e onde ninguém quer ser visto!

O Rio Sella é muito bonito ali, tal como eu me lembrava e tal como eu precisava!

Sentei-me e ali fiquei, primeiro sem fazer nada, apenas a apreciar os encantos da envolvência…

A ponte vista deste lado é muito mais encantadora do que do outro, porque não se vê ninguém, aos magotes lá em cima a espreitar para a fotografia. Deste lado ela está só e linda!

Procurei um sítio menos frontal, gosto de ver as coisas em ângulos inspiradores…

e desenhei!

Fiquei ali tanto tempo, fiz vários desenhos, comi o resto das empadas e do queijo, acabei coma cerveja e só depois é que me fui embora.

O Camín de la Reina tem origem num caminho romano e deve o seu nome à Rainha Isabel II que o percorreu um dia a caminho de Covadonga! Começa logo a seguir à ponte e passa por 2 ou 3 pequenos povoados muito fofinhos!

E fui eu andando, parando e desenhando mais um pouco, aqui e ali!

Eu adoro aqueles espigueiros!

O rio, sempre encantador acompanha boa parte do percurso, tendo até uma central eléctrica algures numa encruzilhada, entre o voltar à estrada principal e o continuar pelo monte acima.

Claro que eu continuei pelo monte acima!

E quase pelo monte abaixo também, com a rua a desfalecer aqui e ali!

Que importa se as ruas têm saída ou se eu vou ter de voltar para trás a qualquer momento? Importa o que eu vou vendo e vivendo!

Então segui para Riaño que aquele embalse sempre me fascina!

“Eu nunca tinha visto o Embalse de Riaño tão vazio, talvez porque passe por aqueles sítios sempre no início da primavera e desta vez era já o fim do verão. Não sei! Mas a sensação foi de inteira novidade! A água era mais baixa, os montes eram mais altos e aquele leve toque de desolação provocado pelo vazio conferiu àquele reencontro um sabor de espanto, que não seria de esperar considerando a quantidade de vezes que já ali estivera antes. É sempre assim, nada está realmente visto para sempre, há uma emoção em cada visita que a faz ser única de novo!”

(in Passeando pela vida – a página)

Riaño é sempre um pueblo encantador, com os montes impressionantes como pano de fundo, esmo se o embalse está em baixo!

E a ponte, de repente, parecia tão alta! Uma sensação curiosa ver tudo de novo e ser como se fosse tudo novo!

O regresso a casa não tinha de ser pelo meso sitio, por isso atravessei o parque natural em direcção a Caín. Eu não iria até lá, mas iria curtir uma paisagem extraordinária e diferente do que vira durante o dia!

Tão relaxante passear pela montanha, tão gratificante sentir todas as variações de temperatura, todas as nuances dos odores da terra! Tão gratificante tudo por ali…

Era ali que eu viraria para casa…

“Não há nada que perturbe a serenidade de uma estrada de montanha, quando não há mais ninguém a percorrer o mesmo caminho que eu. E não há duas montanhas semelhantes, mesmo quando elas se erguem em altos muros de pedra bruta, a pique, a partir do chão, há algo no que vejo e sinto que me leva para os Alpes, algo que me traz para os Picos. E eu passeava por caminhos de Caín, como quem passeia pela primeira vez pelo paraíso, mesmo sendo caminhos tão conhecidos, tão já percorridos. Há sempre algo de novo na beleza, algo nunca visto, que faz com ela valha a pena reviver e revisitar…uma vez e outra…”
(in Passeando pela vida – a página)

E cheguei a casa que naquela noite seria ainda em Sotres…

E foi o fim do… penúltimo dia de viagem… amanhã eu iria para casa, para minha casa!

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