6. Passeando por caminhos Celtas – a Basse-Normandie, o dia do… embarque!

1 de agosto de 2014

Trezentos e tal quilómetros até Cherbourg para apanhar o ferry às 4 da tarde, não há que stressar! É subir calmamente o que resta do país, dar uma vista de olhos numa terrinha ou outra que apareçam no meu caminho e estar lá uma hora antes, para descobrir onde é o porto e embarcar!

Assim despedi-me calmamente de Daon, aquele recanto tão fofinho onde me diverti um bocado.

E segui para norte

passando por Fougères, onde já tinha passado aquando da minha ultima visita ao Reino Unido, mas desta vez eu queria ver melhor e, tal como eu imaginava, aquilo é muito bonito!

Trata-se de uma cidade fortificada encantadora, cheia de construções medievais, em que o antigo convive com o moderno sem quase a gente se dar conta da transição!

Fora da muralha, logo ali, pertinho da porta de Notre-Dame do séc. XIV fica a Eglis St Sulpice, um encanto de igreja, cheia de história, já que foi a primeira de Fougères.

Claro que ela não era assim no séc. XII, quando foi construída, nessa época era de madeira, mas posteriormente foi adquirindo características dos estilos em vigor, quando foi construída em pedra e à medida que foi sendo restaurada, arranjada ou reconstruida!

E as gárgulas sempre me fascinam, sobretudo quando estão tão visíveis como ali!

É muito mais espaçosa e luminosa por dentro do que parece por fora!

Em redor reina a paz, embora mais acima um pouco o trânsito seja quase infernal! Em frente à muralha as casinhas enfileiradas são lindas!

E quando o trânsito é infernal, com direito a obras com semáforos, há que aproveitar as perspetivas da paisagem sobre a cidade antiga e o Jardin du Val Nancon.

A Eglise de Saint Leonard, gótica.
Eu ia apenas passar, pois já lá tinha estado em 2011, mas um senhor de idade que tinha o carro estacionado na frente, fez questão de o retirar para que eu pudesse ver toda a fachada da igreja sem perturbações e depois veio falar comigo.

Estava visivelmente sensibilizado por eu estar ali a admirar a “sua” igreja. Estivemos no paleio um bom pedaço, enquanto ele me contava histórias de batalhas antigas e guerras mais recentes e de como a cidade foi massacrada e reconstruida depois dos bombardeamentos dos Aliados.

Perguntou-me se eu achava a “sua” igreja bonita, eu disse que sim, que ela é diferente do que eu estou habituada a ver, ele sorriu e depois eu tive de a visitar por dentro, enquanto o senhor se afastava para o seu carro, com o passo incerto mas firme. Perguntei-me se ele não teria mesmo estado naquela ultima guerra de que me falava….

E ela é bonita sim senhor, por fora e por dentro!

E desta vez meti a moto por todos os recantos que me apeteceu, nada de ficar num canto a imaginar como será o resto, sem coragem de caminhar ou de ir de moto!

É muito mais fácil assim, a gente pousa a moto um bocadinho, desmonta e vai ver, anda mais um pouco, volta a desmontar e volta a ir ver, até ter visto um pouco de tudo!

Acaba até por ser divertido!

Cheguei cedo a Cherbourg, é sempre assim, o receio de chegar tarde faz-me sempre chegar cedo demais! Fiz um picnic junto à Basilique de Sainte-Trinité, já que era o recanto mais calmo da cidade, que parece uma passagem permanente para um lado qualquer! Eu tinha de fazer horas para ir até ao porto!

E ali começou o meu stress…

Escrevia eu horas depois, no ferry durante uma noite que pareceu não ter fim:

“Há medos que têm a sua razão de ser, pelo menos comigo é sempre assim! É que por vezes esses medos realizam-se, são como os sonhos, tornam-se realidade!

Pois é, e eu tenho medo de embarcar a minha moto num ferry!
Não tenho medo de andar de barco, nem que a minha moto ande num, não, nada disso! O meu medo é de fazer as coisas erradas e não conseguir embarcar direito! Por isso, da última vez que visitei o Reino Unido não tive coragem de comprar o bilhete antecipadamente através de um site qualquer na internet! Então eu fui até Calais e lá comprei o dito bilhete!

Perguntou-me a menina porque não o comprei através da net pois seria muito mais barato… nem tive coragem de responder e paguei quase o dobro, por o estar a comprar na hora e na bilheteira!
E estou de novo a caminho do Reino Unido e da Irlanda e desta vez tratei de tudo antecipadamente através da net! Pois é, tão antecipadamente que marquei a passagem para o dia 1 de junho e não 1 de agosto!”

Foi a sensação mais estranha que eu podia experimentar, dizia a menina “não tem lugar no ferry porque a viagem foi marcada para 1 de junho!” e eu sem entender direito pergunto “E hoje é o quê? 31?” Na realidade eu nunca sei muito bem em que dia estou em viagem e não entendi logo que o problema não estava no dia e sim no mês!

Quando ela me repete “On est en août et «junho» veut dire «juin», n’est pas?” oh meu Deus, até ela entende melhor português do que eu, olhei para o que o seu dedo apontava no meu papel – 1 de junho! M E R D A !

O sistema deve ter assumido a data em que reservei a passagem e não a data em que eu queria passar. Lembro-me que esta foi a primeira reserva que fiz e fi-la muito cedo, pois dela dependia todo o desenho da viagem!

Muito simpática, ela nunca se mostrou stressada, rapidamente me arranjou uma nova passagem para aquele dia, mas 4 horas depois e sem lugar marcado. Paguei a taxa de transferência, mais a diferença do preço dos dois bilhetes (é mais caro viajar em agosto do que em junho) e sorrindo para mim desejou-me uma boa viagem aconselhando-me a gastar o tempo a passear pela zona para que não desse cabo dos nervos!

E fui passear mesmo! 4 horas é muito tempo para esperar!

Estava tão perto da zona de desembarque da batalha a Normandia, como da zona de embarque na minha Ninfa, por isso fui atras das placas até vários pontos de guerra.

Nesta viagem fartei-me de ver cemitérios de diversas épocas e comecei logo ali, com o cemitério alemão de Orglandes onde estão mais de 10.000 soldados enterrados…

Inicialmente os corpos dos milhares de alemães e americanos mortos na zona foram enterrados na pequena vila, mais tarde foram criados espaços próprios para cada povo, para que os seus os pudessem visitar e então surgiu este cemitério que só foi aberto ao público nos anos 60.

Uma visita feita de silêncio, entre o “peso” emocional do locar e a sua beleza sombria…

Um pouco mais à frente uma homenagem e um agradecimento aos libertadores do local…

Anda-se por ali por ruínhas tão bonitas quanto estreitinhas
Quando a rua é estreitinha, tem dois sentidos e ainda encontro um sinal daqueles na berma, pergunto-me como será a seguir se vier um carro ou um trator em sentido contrario?!

E veio mesmo, um jeep, daqueles bem grandões, que cruzou comigo mais à frente, passou por mim com duas rodas fora da estrada e ainda me cumprimentou! São sempre muito simpáticos com as motos (pelo menos comigo) eles sabem que a moto não pode sair do alcatrão por isso arrumam-se eles.

Depois de ruinhas destas podem-se encontrar cidades pitorescas logo a seguir. É apenas uma questão de escolher bem os caminhos!

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Depois de um cemitério fui visitar uma abadia, não está mal e depois seguramente uma igreja e por aí fora!

A abadia é espetacular e fresquinha! Havia gente a cantar lá dentro, o que tornou a visita encantadora!

Tem origem românica do séc. XI e hoje é também uma escola secundária e de ensino de adultos. Puxa, eu gostava de dar aulas numa escola assim!

E lá está, a seguir fui ver a igreja lá do sítio, pois é tão bonita!

É posterior à abadia, é do séc. XIII, é bem menor e tem outros encantos!

E para terminar, e deixar de lado cemitérios e igrejas… fui visitar a Betterie d’Azeville… pois, por ali parece que está tudo ligado à guerra mesmo!

Ali viveram muitos soldados alemães, mais ou menos em harmonia com a população. Hoje ainda há quem fale de como era o relacionamento da população com os tropas e de como as regras eram rígidas para que os tropas não abusassem das pessoas. Acho que havia algum cuidado para que nada “explodisse” entre ambas as partes durante a ocupação!

Construíram a bateria camuflada de zona habitacional, com galerias subterrâneas e postos de observação.

Ao longe aquilo pareciam casas típicas da zona

Mas na realidade eram casemates bem artilhadas…
Claro que o cenário não enganou para sempre e lá acabou por ser atingida pelo fogo aliado e ir boa parte pelos ares!

E lá fui eu, finalmente, para a fila para embarcar! Havia um espanhol por perto mas não me ligou nenhuma, claro que eu fiz o mesmo com ele.

Eu devia estar muito feia ou ameaçadora naquele dia, porque ninguém se aproximou de mim! Ninguém de moto, pelo menos!

Mas, a bem dizer, também não falaram muito uns com os outros! Deixei-os lá com as suas caras fechadas e fui embora. A população comum parecia-me mais simpática do que os motards!

Sentia-me miserável! Como iria fazer a viagem sozinha sem lugar? Abandonada num canto como os ciganos? Andei a ver o barco, sem saber onde me pôr! Não era nada daquilo que eu tinha planeado…

Acabei por me instalar num dos bares a beber cerveja. Outras pessoas se foram juntando e eu lá me fui sentindo mais “aconchegada”, talvez aquela gente não se fosse toda embora cedo e eu não ficasse ali abandonada!

E aquilo tudo começou a mover-se, estávamos a partir para 16 horas de oceano… o suplício!

(continua)

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