40. Passeando por caminhos Celtas – Até aos Picos da Europa

30 de agosto de 2014

O norte de Espanha era o fim do meu caminho celta. Eu não iria à Galiza, ultimo recanto celta antes de chegar a Portugal, mas iria às Astúrias, simplesmente eu queria acabar os meus dias de viagem ali, num dos recantos mais bonitos que conheço!

O meu mapa celta ficaria praticamente concluído nos dois dias seguintes e isso, se por um lado me enchia de satisfação, como sempre acontece quando concluo uma epopeia sem acidentes nem incidentes, por outro lado enchia-me de nostalgia… e os Picos da Europa seriam o sitio perfeito para eu parar, relaxar e passear um pouco, tão perto do céu, tão no meio do paraíso!

O dia acordou ranhoso mas mesmo assim eu não teria de correr por ali baixo até ao meu destino seguinte sem nada ver!

Dax estava ali à mão de semear e eu nada vira no dia anterior, por isso fui passear pela cidade! A cidade é conhecida como termal, portanto com vestígios romanos, como em todos os recantos da Europa onde há termas!

Junto da igreja havia feira, também é costume haver feiras ao fim-de-semana junto das igrejas, hábitos medievais a maior parte das vezes!

A igreja, que é uma catedral, a Cathédrale Notre-Dame de Dax, estava fechada mas a feira estava aberta e muito interessante.

Oh, o aspeto que a comida tinha já aquela hora da manhã! Apetecia atacar logo um frango assado ou um prato de paelha!

E os queijos! Oh os queijos franceses sempre me tiram do sério!

Mas eu ia tomar o pequeno almoço, não ia almoçar ainda, era muito cedo!

Foi curiosa a sensação de estar em casa que se gerou!

Sentei-me numa esplanada onde, pelo que me apercebi depois, toda clientela era gente da feira e por isso amigos e conhecidos entre si. Ficaram muito espantados a olhar para mim enquanto pousava amoto ali ao lado, até deram pareceres onde eu podia encosta-la sem perturbar. Depois quando me sentei e pedi um croissant e um café e o dono do café disse que já não tinha mais croissants os vizinhos das outras mesas deram-me dos deles, que não tinham comido.

“Mangez, vous avez besoin d’énergie pour conduire cet avion la!”

E foi na mais amena cavaqueira que eu me enchi de croissants e queijo e fiambre e sumo de laranja e tudo e não saia mais dali se não me forçasse a afastar com um adeus respondido por uma dúzia de mãos no ar!

Gente simples é gente boa em todos os países! Adorei-os!

A voltinha da praxe pela cidade foi feita de moto. É sempre assim, dou umas voltas por um lado e pelo outro, encontro o que procuro, paro um pouco…

Os morais sempre me fazem parar! Sempre que encontro “trompe l’oeil” eu paro!

Alguns são tão bem feitos que confundem mesmo os olhos, que vêem gente em janelas que não existem ao lado de gente que existe em janelas reais!

E lá estavam as termas romanas!

À saída da cidade, o touro!
As touradas e largadas de touros não são exclusividade peninsular, na França também são muito apreciadas, sobretudo por ali, pelo país basco francês!
As festas de Dax são parecidas com as de Bayonne, toda a gente veste de branco com faixas vermelhas, soltam-se touros e toda a gente corre em loucura pelas ruas, ao estilo do Festival de San Fermin em Pamplona e Navarra.

E por falar em Bayonne, era para lá que eu iria a seguir!

Ficava mesmo no meu caminho!

O dia estava cinzento, o que era uma pena, pois aquela cidade com sol é uma delícia! Assim o rio Adour estava meio tristinho com a cidade em seu redor menos colorida do que habitualmente!

A catedral sempre me despertou o interesse e nunca a tinha conseguido ver por dentro!

Sempre que passei em Bayonne havia festa e gente pelas ruas e a catedral estava fechada!

Mas desta vez a festa ia longe e estava mesmo à minha espera: aberta e sozinha!

A Catedral de Sainte-Marie de Bayonne é uma construção gótica extraordinária! Demorou uma eternidade até estar pronta, desde o séc. XIII quando começou a sua construção, com uns 4 séculos para acabar o corpo e mais 2 para terminar as torres! Como outras construções pela Europa, demorou para caramba a reunir as condições para a irem terminando!

Aquele teto, como sempre numa construção gótica, lindo!

E o claustro!

Como eu queria vê-lo…

Não havia ninguém por ali, embora o claustro tenha saída direta para rua, e eu sentei-me no chão e fiquei ali a olhar!

O centro do claustro é relvado e a igreja é visível dali como não é da rua, já que as casas estão muito perto e não dão ângulo para a ver!

Não resisti a tomar um café ali mesmo, numa esplanada junto ao edifício e curtir a sua presença tão perto!

E ali mesmo, nos recantos formados pelo próprio edifício da catedral, estava gente a vender as suas pinturas!

Pinturas para todos os gostos, incluindo o mau gosto!

Depois vinham as ruinhas, lindas, ladeadas de casa altas e coloridas!

Eu adoro aquelas ruas!

Com gente “maluca” sempre em festa algures! Pelo menos é assim sempre que ali passo!

A sensação de estar ali sempre se assemelha para mim a estar numa cidade espanhola!

Cheia de gente animada e viva e ambiente de festa, mesmo quando a festa já foi há tempos!

Apreciar a cidade de longe, do outro lado do rio…

Passear pelos seus recantos e descobrir pormenores curiosos…

Era tudo o que eu queria fazer há algum tempo, por isso desta vez eu passei lá no fim de viagem e não no início, quando apanho sempre as festas da cidade no auge!

A minha menina ainda encontrou uma prima antes de partirmos de Bayonne! 😀

O caminho é sempre o mesmo, por ali, e faço-o como se fosse uma rotina infinitas vezes repetida… e é! Quantas vezes já passei em Saint-Jean-de-Luz…

Depois entra-se em Espanha, quando a praia alterna com a montanha…

A foz do rio Agüera em Oriñón, sempre impressionante!

E a estrada encantadora que me levaria ao meu destino!

Chegar ali, depois de uma viagem cheia de coisas encantadoras, foi como colocar calmamente a cereja em cima do bolo!

Perdi-me pelos montes, como sempre me perco quando ando pelos Picos da Europa! São simplesmente caminhos por onde vale a pena e apetece perder-me!

Até que decidi subir até onde eu iria dormir!

As nuvens iam ficando ao meu nível… ou eu ao nível delas! Ali eu podia dizer que andava mesmo com a cabeça nas nuvens!

Eu queria subir e ficar, ter tempo para parar, ficar quieta, curtir aquele paraíso, naquele sitio onde eu já não ia há muito tempo!

Porque, como todos os sítios onde eu passo com frequência, eu alterno as zonas que visito, para que não me farte, para que haja sempre algo que eu não vejo há tempos, quando volto a passar!

O tempo que eu demorei a percorrer aqueles caminho de encanto, as vezes que eu parei, apenas para olhar, por vezes até me esquecendo de fotografar!

O sol punha-se e eu chegava a casa, que naquele dia seria em Sotres! Aos anos que eu não ía ali!

E foi o fim do 33º dia de viagem…

73 – Passeando até à Suíça 2012 – A França – Gimel les Cascades et le Château de Sédières

4 de Setembro de 2012

De manhã um belíssimo pequeno-almoço me esperava! Ui, e como eu gosto de comidinha variada antes de partir! Fiquei a saber, enquanto comia, que por ali pela zona havia uma série de coisas curiosas para ver. Uma das vantagens de se viajar sozinha é que as pessoas falam para mim, dizem-me coisas que me interessam. Quando viajei acompanhada não havia tanta interação, porque a tendência é falar para quem está comigo e as pessoas não se metem na conversa!

Rapei do mapa e tratei de ir ver primeiro o que havia ali na zona, para depois ir mais longe, onde planeara ir.

Eu estava em Lapleau, uma terrinha tão simpática quanto perdida no meio de lado nenhum! Na noite anterior pensei que o meu Patrick (GPS) estava doido ao dizer-me que eu estava a chegar e eu apenas via ruelas estreitas com mato dos dois lados! Mas era mesmo ali, uma pequena localidade, que pude ver no dia seguinte, era bem bonita!

Com direito a igrejinha medieval e tudo!

As casinhas são deliciosas por ali! Apetece bater às portas e pedir para ver como são por dentro!

E o meu destino ficava a uns trinta e poucos quilómetros dali: Gimel-les-Cascades e as suas cataratas!

Curioso que a entrada para o recinto das cascatas faz-se por um café na beira da estrada, onde fica um portãozito sem segurança!

Depois começa-se a descer por caminhos que levam de uma cascata para outra, passando por uma casa que não entendi o que fazia ali!

As cataratas são compostas por três quedas sucessivas do rio Montane de uma altura total de 143 metros: Le Grand Saut de 45m; La Redole de 38m e La Queue de Cheval de 60m, esta ultima mergulha no “Gouffle de L’Inferno”, achei piada dizerem “inferno” e não “enfer”.

A primeira aparece logo a seguir à casa do caminho: Le Grand Saut de 45m

Muito bonita!
Cada vez que desço penso que terei de subir tudo de novo! E eu já estava a descer tanto apenas para a primeira catarata!

Depois lá em baixo a gente segue o percurso da água, pois a catarata seguinte estará mais à frente.

E lá está La Redole de 38m

E tinha eu de descer mais uma infinidade de metros!

Muito bonito o percurso e o ambiente!
Tive a sorte de andar completamente só por ali, o que fez a visita revestir-se de encanto! Não havia ninguém a tentar ser fotografado em frente das quedas de água como me aconteceu no parque de Plitvička Jezera na Croácia, em que as pessoas faziam filas para a fotografia!

Deu até para me sentar um pouco e apreciar o momento!

E cheguei à Queue de Cheval de 60m e ao “Gouffle de L’Inferno”

E comecei a subida infinita, por um caminho em ZZ e com o barulho da água bem forte atrás de mim!

A aldeia, que se chamou apenas Gimel até há poucos anos, hoje chama-se Gimel-les-Cascades e é muito bonita, cheia de história pois é de origem medieval.

O que eu gosto daquelas aldeiazinhas francesas, com as ruínhas muito bem desenhadas e limpas, as casinhas nas bermas parecem projetadas especialmente para conviverem com qualquer época histórica, pois continuam lindas, tantos séculos depois de terem sido erigidas!

E o precipício das cataratas é logo ali! A gente pode mesmo ouvir a água que corre e bate lá em baixo!

Mas havia mais coisas que eu queria ver por aquelas bandas. Segui o meu caminho, ainda afogueada pelo calor da exploração das cataratas, na direção de Tulle, mas o meu destino ficava fora do caminho, uns quilómetros mais à frente.

Começa-se por se passar por lagos e floresta, afinal dizem que são 130 hectares de terreno florestal!

Só o percurso já valia a pena o passeio!

Mas o que eu queria visitar era o Château de Sédières, um castelo medieval encantador do séc. XV, que foi remodelado em estilo renascentista um século depois, e hoje é local de exposições!

Ao chegar ao parque de estacionamento da propriedade, um enorme cão veio na minha direção. Já um dia um cão me pôs ao chão mais a minha moto, por isso não esperei que se chegasse a mim e pus o descanso “que me morda mas que não atire comigo e com a moto!” A dona era uma senhora gorda que o chamou logo. O cão obedeceu e ela exclamou para o jardineiro e para as pessoas que andavam por ali “olhe, o senhor motard não teve medo nenhum da cadela!” mas o seu espanto acabou por se traduzir em grandes gargalhadas quando eu arrumei a moto e tirei o capacete, “é uma senhoraaaa!!!” exclamou ela!

Fez-me uma festa, fartou-se de falar comigo e eu fiz a minha parte conversando outro tanto com ela, enquanto caminhávamos na direção do castelo. Ela vivia ali na zona e ia frequentemente passear a cadela para ali pois é uma propriedade muito bonita e livre de trânsito. Perguntou-me se eu também ia frequentemente passear para lá, pois nunca me vira! Disse-lhe que era a primeira vez pois não era dali. Ficou espantada por eu ser portuguesa “mas você fala o verdadeiro francês!” Percebi que se referia ao francês de França e não ao francês de quem está de passagem!

Fiquei lisonjeada por saber que tenho mais sotaque do norte no meu português, do que de estrangeira no francês!

E lá estava cadela toda contente a enquadrar com o castelo!

Dois motivos me levavam ao castelo: a sua beleza arquitetónica e perfeito enquadramento na propriedade deslumbrante e a exposição que estava patente no seu interior!

Não é todos os dias que se podem ver obras de Niki de Saint Phalle (falecida em 2002) ao vivo! A pintora/escultora das bonecas gordinhas e coloridas!

Ou obras de Arman, (falecido em 2005), o pintor/escultor das “tralhas” e das desconstruções!

A conjugação do interior antigo com as obras modernas fazia um efeito curioso e agradável! Perdi-me ali dentro!

Depois vieram os lagos de novo e os enquadramentos que o castelo permite no seu ambiente envolvente.

E despedi-me do belo castelo pois tinha tantas coisas fantásticas para ver ainda naquele dia!

(continua)