15. Passeando pela Grécia/Balcãs – a caminho da Sévia com muita chuva…

2 de setembro de 2022

Às vezes perguntam-se se eu desenho os trajetos diários das minhas viagens no computador e depois os coloco no GPS para os seguir no local. Claro que não! Eu sei lá se em agosto me vai apetecer seguir um trajeto que desenhei e maio ou junho! Cada caminho é decidido na hora de acordo com as coisas que quero ver, mas, se não me apetecer ou o tempo não ajudar, eu improviso e passo apenas onde me apetecer! Não tenho espírito para ser escrava nem de mim mesma!

Embora estude atempadamente e direitinho tudo o que posso querer ver, é na hora que eu decido o que vou realmente fazer! E com o tempo que estava lá teria eu de improvisar até ao meu destino, nadando de moto até Kuršumlija…

Desanimadora a paisagem molhada a partir da minha janela…

Como sempre que está chuva quando acordo, enchi-me de comida num pequeno almoço muito simpático. Já que não poderei ver muita coisa posso, pelo menos, comer com muita calma!

Depois, sempre com muita calma e paciência, enchi-me de roupa, transformando-me na versão negra do Boneco Michelim para me fazer ao caminho. Detesto vestir fatos de chuva no verão, quando o que apetece realmente é vestir menos roupa!

Ao menos hoje, se a chuva molhasse minha mão, eu não sentiria o pulso esquerdo febril, o que acalmaria um bocado aquela dor permanente que me acompanhava dia e noite… sei lá, digo eu!

Ao menos não estava tanto calor como os calções e t-shirts dos transeuntes davam a entender!

Não sou arquiteta, mas as construções “diferentes” sempre me atraem. Já desviei muitas viagens por dezenas de quilómetros do seu curso, apenas para ver um monumento, um edifício ou uma ruina!

E ali estava o Panorama Pleven Epopee 1877 que eu queria ver!

Também conhecido como Pleven Panorama, contém representações dos acontecimentos da Guerra Russo-Turca de 1877, em particular o Cerco de Pleven. Mais uma forte referência ao cerco, que durou 5 meses, tornou a cidade famosa internacionalmente e foi crucial na libertação da Bulgária, após séculos de domínio otomano.

Aquele é o único monumento do género em todos os Balcãs e foi construído em 1977, exatamente 100 anos depois da libertação de Pleven.  

O monumento foi construído no local do campo de batalha e dizem que os três anéis horizontais que circundam todo o edifício, simbolizam as três batalhas de Pleven. O de baixo, ao que parece, simboliza o cerco da cidade!

O ar de O.V.N.I. ficava ainda mais evidente com o chão molhado e o céu cinzento!

Não há forma de uma pessoa não se sentir um bocado miserável quando viaja à chuva! Sobretudo quando sabe que está a atravessar uma zona bonita, com um rio onde se pode caminhar e fazer fotos giras… Mas com aquele tempo não dava para esses devaneios, por isso lá fui seguindo ao som da minha musica, até que uma construção encantadora me fez parar! Era o Ресторант “Родина” – em tradução macaca do Google – Restaurante “Rodina”.

Normalmente eu pararia numa estação de serviço, para ficar protegida da chuva enquanto descansasse e tomasse qualquer coisa, e até havia duas ao alcance da vista. Mas aquela casinha em forma de moinho retirado de um conto de fadas, era muito mais atrativa!

Atrativa o suficiente para que eu me dispusesse a fazer um picnic à chuva e me dedicasse mesmo a fazer uma ou duas aguarelas, meio borradas pelas pingas da chuva, mas muito engraçadas!

Uma pena que estivesse fechado senão eu teria almoçado ali mesmo, seguramente!

E segui para Sófia, pois não havia muito onde ir na chuva!

Lá estava a Catedral de Alexandre Nevsky (sim, ela tem um nome que não é Catedral de Sófia!) uma obra arquitetónica impressionante que fica no centro da praça. Foi construída no início do século XX e sua arquitetura reflete a influência da tradição ortodoxa oriental combinada com elementos do Renascimento russo. Construída em mármore branco e granito tem aquele ar robusto, mas elegante, com um estilo moderno de influencia neobizantina, visivel nas cúpulas altas e os detalhes das fachadas. 

Não pude deixar de sorrir ao recordar que, da primeira vez que a vi ela me fez lembrar um grande bolo decorado de branco, verde e dourado, no meio da grande travessa que era a praça!

Ok a praça é grande, mas não se percebe muito bem onde se pode estacionar! Dei duas ou três voltas para parar e já ia para dentro quando dois homens me avisaram que não devia deixar a moto ali. A sério? Parecia-me tão bem estacionada junto a uma fileira de carros! Tinha de a pôr no outro lado da praça onde era permitido o estacionamento ao publico, ali era só para entidades oficiais não sei de quê.

Então puseram-se a inspecionar a minha moto em pormenor. Um deles tinha encomendado uma NT1100 há meses e diziam-lhe que só a teria lá para janeiro!

Ficou muito chocado quando eu disse que a minha já tinha 6 meses. “Seis meses? Como é possível se simplesmente não existem para entrega?!”

“Olhe que não, ainda ontem vi uma em exposição em Drama, na Grécia”

“Não pode ser, você é que deve ser muito importante no seu país para ter uma NT há tanto tempo!”

E lá foram embora, convencidos de que eu era uma personalidade importante no meu país, para ter uma NT com 6 meses e já com 20.000km!

O interior apresenta uma planta em forma de cruz grega, com ícones religiosos decorando as paredes e tetos.

A história da Catedral de Sofia remonta ao período pós-libertação búlgara do domínio otomano, quando a construção da catedral foi iniciada para celebrar a independência nacional. Ao longo dos anos, a catedral testemunhou eventos marcantes na história búlgara e desempenhou um papel central na vida religiosa e cultural do país.

“As catedrais sempre me fascinam, mas a de Sófia é daquelas que me atraem particularmente, porque é ortodoxa e o seu estilo neobizantino me fascina! Está ali, no centro da praça Sveti Aleksandar Nevski, o mesmo santo a quem a catedral é dedicada, como um grande ícone vivo da capital búlgara! No interior ela é grande, ampla e sombria, cheia de beleza antiga, como se tivesse muito mais que os seus cento e poucos anos. Eu sempre tenho cuidado ao entrar num templo de outra religião de que desconheço os costumes, não gosto de perturbar quem está, mas ali vieram ter comigo, receberam-me com simpatia e puseram-me à vontade para visitar, só deveria pagar um valor para poder fotografar. Acho justo, aquela beleza tem de ser cuidada! ” Passeando pela Vida – a página in Facebook

O imponente trono do Czar!

Aqueles tetos altíssimos, que quase não conseguimos ver quando as luzes ofuscam o nosso olhar, são revestidos com afrescos que eu gostava de observar mais de perto. Mas dão, mesmo sem os conseguirmos ver direito, uma atmosfera impressionante como se estivéssemos no amago de uma entidade imensa!   

Tinha de parar na Praça da Independência Nezavisimost, só para apanhar a antiga casa do Partido Comunista Búlgaro, hoje funciona ali a Assembleia do Povo da Bulgária.

É um dos três edifícios de “estilo Império de Stálin” que foram construídos nos anos 50 para alvergarem diversas dependencias governamentais e continuam até hoje a ser sedes do governo Búlgaro.

“No coração de Sófia fica o monumento a Santa Sofia, a padroeira da cidade, no mesmo sitio onde esteve a estátua de Lenin, nos tempos soviéticos do país. A bela escultura, em bronze e cobre, fica a 16 metros do solo e pode ser vista de longe, acima de todo o movimento do transito. Hagia Sophia segura na mão direita uma coroa de louros, símbolo da glória, e no braço esquerdo esvoaça uma coruja, símbolo de sabedoria. Tão bonita!” Passeando pela Vida – a página in Facebook

A sua fisionomia foi baseada numa imagem de um emblema da cidade retirado de uma moeda antiga.

Ia deixar Sófia e a Bulgária para trás, apenas parei para captar uma ultima perspetiva da cidade, com os edifícios da praça ao fundo, e segui caminho antes que a chuva voltasse!

E lá cheguei à ponta de uma fila de carros que, certamente, era para passar a fronteira. Felizmente não chovia, mas, mesmo assim, fui furando tanto quanto pude até chegar aos separadores que não deixavam espaço para a habilidade.

E era tão custoso e doloroso andar numa fila de arranca-e-para com a mão esquerda sem força nem agilidade para acionar a embraiagem de metro em metro!

Quando cheguei ao posto da fronteira estava exausta e sem força nas mãos sequer para retirar os documentos da bolsa de cinta! E enquanto eu lutava com o fecho da bolsa e tentava retirar a carteira de lá de dentro veio a pergunta da praxe:

“Your friends?”

Não resisti e soltei uma gargalhada soltando os braços e deixando-os cair para baixo.

“no friends, I’m alone!” Felizmente o homem era um policia jovem que, depois de ficar surpreso com a minha reação, sorriu também.

Naquele momento eu já pus o passaporte no bolso de trás das calças, para não ter de andar sempre a lutar com a bolsa de cinta, a cada vez que tinha de mostrar os documentos.

E entrei na Sérvia!

Fui direta para o alojamento, rezando para que fosse um sitio fixe, com restaurante ou cafetaria, para eu não ter de sair de moto para lado nenhum.

Só ao chegar me lembrei que o sitio não era perto do centro de Kuršumlija, mas, felizmente, tinha restaurante no rés-do-chão. Embora se chamasse Motel, era uma pensãozinha de beira de estrada, onde paravam imensos camionistas para comer, nas suas rotas de grandes distâncias, a considerar pelas matriculas dos camiões que já lá estavam e dos que foram chegando depois de mim.

A minha chegada teve um impacto engraçado, as pessoas que estava no café ficaram em silêncio assim que eu entrei, só recomeçando a falar quando eu segui para a receção. As pessoas da receção ficaram muito espantadas a olhar para mim, como se eu tivesse acabado de aterrar num disco voador.

Depois percebi que não se tinham dado conta de que eu era uma mulher, perceberam que iam ter um motociclista como hospede, já que eu o tinha comunicado no momento da reserva, mas pensavam que eu seria um moço barbudo e tatuado, de correntes pendentes do cinto das calças.

Ainda me ri com eles ao jantar, quando me confidenciaram que a minha moto era muito bonita e que eu parecia uma versão moderna de um cavaleiro Raška!

Raška eu?

Então percebi pelas suas expressões que aquilo devia ser um cumprimento. E era, estavam a referir-se a principados e cavalarias medievais sérvias!

Amanhã darei mais um passo de muitas centenas de quilómetros na direção de casa, até Montenegro.

13. Passeando pela Grécia/Balcãs – Bulgária e a bela Plodiv

31 de agosto de 2022

Foi com uma profunda sensação de perda que eu acordei e sai para a rua…

Eu sempre detesto quando as pessoas começam a chamar “regresso” à minha viagem, mas a realidade é que aquele era o ponto em que até eu sentia que começava a regressar…

Se nada me tivesse acontecido o meu caminho seguiria para a Turquia e eu teria uma infinidade de coisas para descobrir ainda. Mas na realidade era hora de seguir para a Bulgária e deixar a Turquia para outra viagem, tentando ignorar que estava a menos de 500km de Istambul.

Depois de 3 PanEuropeans e 2 Crosstourers com veio de transmissão, ter uma moto com corrente deixava-me um bocado apreensiva. Eu já inspecionara se o Scottoiler tinha óleo e se a corrente estava em boas condições, mas não há nada mais persistente que uma cisma e, quando vi um stand da Honda, fui lá pedir para darem uma olhada à saúde da minha motita.

“Ter uma moto com corrente, e que deu um trambolhão há pouco tempo, requer que lhe dedique alguns mimos. Vamos ver se esta tudo bem…”

Na época havia muito poucas motos novas nos stands e muita gente estava há meses à espera da sua NT1100, mas ali havia uma toda vaidosa na montra!

“Uma mana da minha Penélope à venda, novinha ❤️
A minha motita estava ótima, não precisava de nada, apenas eu não consigo ver direito a pressão dos pneus, com esta mão marota a não ajudar nada.
A minha motita foi recebida com muita admiração por ter 20.000km, ainda não tinham visto uma NT1100 tão rodada! E ao verem a minha incaparidade na mão da embraiagem, quase me pegaram ao colo e me mimaram! Chamaram-me super woman ❤️” in Facebook

Percorrendo a Macedónia grega, aquela que obrigou que a Macedónia país se chame Macedónia do Norte, para que não se confundam!

Logo à frente apareceu Xanthi, a cidade das mil cores, dizem.

A mim pareceu-me uma cidade muito alegre e animada, cheia de sol, de gente e de movimento. O sitio ideal para parar e comer qualquer coisa, que o alojamento não tinha pequeno almoço!

E lá estava a catedral: Καθεδρικός Ναός Αγίας Σοφίας Η Σοφία του Θεού

Sim, este é o nome da catedral de Xanthi! E Xanti escreve-se Ξάνθης

Como não nos sentirmos analfabetos num país daqueles? Será que esta é uma das aflições que deu origem à expressão “viu-se grego”? Pessoalmente eu vejo-me sempre grega naquele país, e dizem que os gregos são eles!

Em língua que se leia o nome da catedral de Xanthi é: Catedral de Santa Sofia a Sabedoria de Deus

As igrejas ortodoxas são sempre fascinantes por dentro, mesmo as mais pequenas e mais modestas, por isso, seguramente, a catedral também tinha de ser linda!

E, mesmo estando a contar com exuberância, eu sempre me espanto! Com as cores vivas, os detalhes decorativos, os muitos desenhos e pinturas e, claro, os dourados!

Felizmente não havia lá ninguém, sempre me sinto incomoda perturbando a orações das pessoas com a minha presença curiosa, mesmo se me tento tornar invisível. Todo aquele ambiente me impressionava, eu tinha de ter tempo para ver tudo com calma.

Os caminhos para Bulgaria não são muitos naquela zona. É preciso decidir entre uma grande volta pela esquerda ou uma grande volta pela direita e eu tinha escolhido ir pela costa do mar Egeu.

Eu sabia que havia lago e mar mas, estranhamente, a sensação que tinha era de circular por um grande lago, com zonas pantanosas!

Logo à frente fica Porto Lagos, tão português escrito numa placa, depois de tanto tempo a ler coisas esquisitas por todos os lados!

Porto Lagos fica na barra que separa o segundo maior lago de toda a Grécia, o Lago Vistonida, do Mar Egeu e eu tinha dificuldade em distinguir um do outro, já que tudo parece lago por ali!

E lá estava o Santo Mosteiro de Agios Nikolaos!
Aquele mosteiro é uma dependência do Mosteiro de Vatopedi no Monte Athos. E é único, pois foi construído sobre duas pequenas ilhotas e parece estar flutuar no Lago Vistonida. 

A sensação de encontrar algo que procuro, algo que vi em fotos, livros ou documentos, e descobrir que tudo é exatamente como eu imaginara, é de puro êxtase!

No primeiro ilhéu encontra-se a igreja de Agios Nicolaos e no outro a capela Panagia Pantanassa.

A igreja foi construída para substituir uma anterior destruída num desastre, é dedicada a São Nicolau porque uma imagem de São Nicolau foi encontrada ali. 

Não consegui deixar de lembrar-me do nosso alentejo ao apreciar as paredes brancas, com janelas contornada a azul!

Uma ponte pedonal de madeira conduz ao primeiro ilhéu e uma segunda ponte liga os ilhéus entre si.

Reza uma lenda que, quando aquela zona estava sob o domínio turco, em Porto Lagos vivia um monge santo asceta que curou a filha do senhor daquelas terras. Este, num gesto de gratidão, ofereceu a área ao mosteiro de Vatopedi, no Monte Athos.

Uma outra lenda mais antiga conta que o mosteiro de Agios Nikolaos foi inaugurado com a presença do Imperador Bizantino Arcadio, para agradecer à Virgem Maria por tê-lo protegido de um naufrágio no regresso a Roma.

Tudo é tão bonito e acolhedor por ali que tinha quase um toque de espaço de recreio e não de oração! Felizmente não estava ninguém por lá enquanto andei a explorar, mas essa realidade estava prestes a mudar, pois ao longe eu podia ouvir autocarros a chegar e muita gente a preparar-se para invadir as pontes até ao mosteiro!

Felizmente as pessoas eram respeitosas e foram-se chegando aos poucos sem perturbarem demais a calma do lugar. Seguramente era turismo religioso, pois havia uma atitude de respeito, que não perturbou o lugar.

E enquanto elas se amontoavam no velário eu pude ainda apreciar em paz todos os recantos que me fascinavam, com direito a picnic em local privilegiado e tudo! Pode-se dizer que foi um picnic sagrado!

Ao longe o mosteiro parecia um pequeno recanto de férias…

Eu adoro conduzir, mas também gosto muito de parar, por tudo e por nada. Estava calor e eu aproveitei para parar numa estação de serviço para me refrescar e tomar um café, que costuma ser bastante decente em terras gregas. Não valia a pena por gasolina naquele momento, já que a gasolina na Grécia era bastante cara e na Bulgária seria bem mais barata. Encostei-me por ali a ver os comentários dos meus amigos facebookianos, que estavam a acompanhar a minha viagem. Então uns fulanos se aproximaram de mim e da minha moto!

“Fico sempre surpreendida quando alguém me vem ensinar a viajar, como se existissem fórmulas decretadas para o efeito! Mas a verdade é que dois tipos meteram conversa comigo e um foi logo criticando isto e aquilo, assim que percebeu que eu tinha planos. Eu tentei dar a conversa por terminada, mas tive de ouvir que é uma parvoíce planear muito, que o certo é ir rolando e curtindo a estrada, dormir no hotel mais perto e aproveitar a vida e tive de ver um vídeo que fez em alta velocidade (140km/h valha-me a santa, se isso é tão alto assim!)
Pois é amigo, para curtir a estrada eu não precisava de vir para a Bulgária, não faltam estradas boas em Portugal, os 40.000km que faço por ano são feitos de todas as maneiras, por todos os lados e como me apetece!
“40.000km? Ninguém faz tanto quilometro num ano!!!!” Exclamou com ar de gozo…
Claro que não, eu compro as motos já com os km feitos 😉” In Facebook

Vamos lá embora para a Bulgária que não me apetece aturar mais maluco nenhum, sobretudo malucos que me vêm ensinar a viajar, mas nunca saíram do seu país!

A perola mais encantadora que recebi foi um “ah, Portugal não é um país grande! A Grécia é muito maior, uma volta por aqui é muito mais que uma voltinha por lá!” disse o super-herói sorrindo.

“Claro que sim, mas eu estou cá neste momento e farei mais de 4.000km só para chegar lá!” – Acho que ele não tinha pensado nisso!

Sempre me sinto privilegiada quando cruzo com uma placa que aponta um país longe de minha casa. Isso fazia-me lembrar da primeira vez que passei por aquela zona, saía da Turquia na direção da Bulgária, e cruzava com uma placa que dizia “Bulgaristão” e experimentei de novo a sensação de euforia que senti da primeira vez, só por estar ali de novo!

O encanto quebrou-se quando alcancei carros em fila, parados! Mas a fronteira ainda era longe, não podia ser fila para lá! Seriam obras? Um acidente? Não me apetecia ficar ali parada, quando havia tanto espaço para ir furando!

E sim, era a fila para a fronteira, vários quilómetros de fila. A cada curva eu podia vê-la sem fim, a perder de vista na curva seguinte, até finalmente chegar verdadeiramente à portagem!

De onde vinha aquela gente toda, se no meu caminho não havia transito nenhum? Ainda pensei que fossem os milhões de istambulenhos a sair de Istambul e a virem passear para a Bulgária, já que a cidade é tão sobrelotada, mas não, eram quase todos búlgaros!

Eu sempre disse que os búlgaros passeiam para caramba!

Era a primeira fronteira física/terrestre que eu atravessava, já que até ali tinha passado fronteiras em portos. Não havia nenhuma moto na fila, apenas eu e a minha motita e, no entanto, quando chegou a minha vez a pergunta da praxe surgiu: Your friends?

Ao tempo que eu não ouvia aquilo! De alguma forma era como se me sentisse em casa!

No friends, i’m alone!

O homem, nitidamente, aproveitou para conversar um pouco e perguntou onde eu ia, eu respondi que ia visitar o seu país a caminho de casa. O seu ar de surpresa, estas a ir para casa por aqui?

Sim, todos os caminhos vão dar a minha casa, senhor, assim eu queira!

“A Bulgária recebeu-me com a maior carga de água, para lavar o lixo da moto.
Normalmente não sou muito contraditória, mas nestas coisas sou:
– Se trago o fato de chuva e não o uso, fico lixada, andei a passea-lo sem o usar!
– Se o trago e o uso, fico lixada por ter de o vestir no calor e andar por aí toda enchouriçada!
– Se o trago, chove e não o visto a ver se a chuva passa, fico lixada porque devia vesti-lo pois para isso o trouxe!
– Se o trago e o visto, porque começa a chover… fico lixada porque a chuva passa!
– Se não o trago, fico lixada comigo porque fui uma inconsciente e a qualquer momento vou levar com uma chuvada na testa!
Tão eu!!! 😀” in Facebook

É claro que segui numa corrida por ali acima até Plovdiv. Entretanto a chuva parou mas, mesmo assim, eu não perdi mais tempo. Percebi que não haveria ninguém na receção no alojamento quando chegasse. Eu já lá tinha estado uns anos antes e tinha sido muito bem-recebida. Na época cumprimentei as pessoas pelo seu acolhimento, mas desta vez não iria ter direito a nada, certamente, mas paciência.

E no entanto!

“Quanto tempo as pessoas se recordarão de nós após a nossa passagem?
A tradição ainda é o que era aqui na Old Town Plovdiv!
Estive aqui em 2016 e fui recebida com mensagem personalizada. Hoje voltou a acontecer, mas tive duas, uma na entrada e outra na porta do quarto. Depois de várias mensagens pelo Telegram, tudo estava perfeito à minha chegada. Eu adoro este hostel” in facebook

Eles lembravam-se de mim! Até o gato era o mesmo!

Cada vez que volto a uma cidade tenho em mente coisas diferentes para ver e fazer. Desta vez queia ir passar o serão à Kapana, o distrito das artes da cidade.

O alojamento fica no topo do centro histórico, a que chamam Old Plovdiv, estão é só ir descendo as ruelas empedradas e apreciando as belas casas coloridas, com debruns bonitos.

Cá em baixo atravessar a estada movimentada e lá está a Kapana!

Kapana, o quarteirão das artes!
Situado no coração de Plovdiv, lá estava o encantador bairro Kapana, um centro vibrante de criatividade e expressão artística. Um bairro que já foi repleto de oficinas de artesãos no século XV

O bairro histórico passou por uma transformação notável nos últimos anos, evoluindo para um próspero bairro artístico que atrai visitantes de perto e de longe. 

Uma das características mais marcantes de Kapana é a infinidade de murais que adornam suas paredes, cada um contando uma história única e aumentando o fascínio da área.

Caminha-se pelas suas ruas de paralelo e somos envolvidos por um ambiente pitoresco e acolhedor

Os murais pintados contribuem significativamente para esse encanto, infundindo cor e vida em cada recanto. 

Desde designs complexos que mostram o folclore local até peças abstratas que despertam a contemplação, esses murais servem como contadores de histórias visuais que cativam tanto residentes quanto turistas.

Artistas locais se reúnem para criar obras impressionantes que refletem o espírito da comunidade. Esta vibrante comunidade artística não só enriquece a paisagem cultural de Kapana, mas também desempenha um papel fundamental na formação da sua identidade como bairro eclético e dinâmico.

O charme do bairro Kapana é inegável.

O bairro é um testemunho do poder transformador da arte

Kapana tornou-se não apenas um destino de visita obrigatória, mas também um exemplo brilhante de como a criatividade pode dar nova vida aos espaços urbanos.

Jantar num ambiente único, onde a arte se fundia perfeitamente com a gastronomia, foi uma experiência fantástica. Estar cercada por murais impressionantes e elementos artísticos elevava a atmosfera a outro patamar! 

Sentei-me numa esplanada ao ar livre, coisa que sempre melhora a experiência e o humor, e permiti-me desfrutar da beleza do ambiente enquanto saboreava um prato de carne deliciosa e um copo de vinho local, bem ao meu gosto.

E pronto, depois era hora de voltar a subir as ruelas até ao alojamento, procurando fazer caminhos diferentes, que não gosto de voltar pelo mesmo caminho que fui.

Vamos lá tomar um banho e dormir que tenho uma mão para por a descansar…

30. Passeando pelos Balcãs… – E cheguei a Bucareste!

23 de agosto de 2013

Naquele serão eu estive a beber cerveja e a comer pizzas até às tantas. O hostel tinha a modalidade “faça você mesmo a sua piza” e estavam por lá uns malucos que se fartaram de as fazer para toda a gente. As cervejas eram enormes e deliciosas, por isso não me faltou nada para ser feliz, a considerar que estava a tratar de recuperar o peso que perdera!

O hostel ficava numa ruela sem transito e eu pensei que não haveria qualquer problema em deixar a moto na rua, mas fui vivamente aconselhada a mete-la no quintal ao lado, porque na rua nada era seguro! Oh valha-me Deus, afinal tudo aflito que eu ia à Roménia, que lá roubam e assaltam e afinal na Bulgária já não posso deixar a moto numa rua longe de tudo porque não é seguro?

Logo ao lado, depois da sebe, ficava a zona do forno e das mesas corridas onde a gente fazia e comia pizas! Ninguém ficou indiferente às manobras da moto e a conversa foi naturalmente para de onde vinha eu de moto! Havia lá muita gente da Austrália, um pequeno grupo de rapazes viajava por um mês pela Europa, pelo que percebi, para beber e participar em todo o tipo de festas! Dizia-me um que viajar de moto devia ser a coisa mais aborrecida do mundo porque, além de nos cansarmos, não podíamos beber! Mas eu estava a beber, respondi-lhe eu com a minha cerveja, que parecia quase de litro, na mão! “pois mas não te podes embebedar!”!

Oh rapaz eu para beber não venho tão longe! Não falta o que beber na minha terra, não tenho necessidade de correr a Europa de bebedeira em bebedeira! A verdade é que só falavam do que se bebia aqui e ali, e que em Sofia as bebidas são mais baratas que em Varna e, tarde da noite saíram, chamaram vários táxis, e foram todos para Varna enfrascar mais um pouco!

A verdade é que no dia seguinte de manhã ninguém acordava para vir servir o pequeno-almoço nem para abrir as portas para eu sair!

Estava farta de estar ali, um mundo de excessos nunca foi o meu mundo, sobretudo quando são excessos que me tiram a consciência e me privam de viver o dia! Quando me quiser embebedar fá-lo-ei na minha casa, pois assim vou para a cama e nem faço cenas, nem perco nada da vida… opinião minha, claro!

Este foi um dia grande para mim, de repente iria realizar dois dos grandes objetivos da minha viagem! Eu sei que podem parecer meio malucos esses meus objetivos, mas há coisas simples que significam muito para mim, mais do que estar em algum momento histórico em algum lugar! Vou só, e é nessa “solidão” que eu me realizo ao sentir-me onde desejei ir!

O primeiro objetivo era nadar no Mar Negro! Claro, com tanta vontade de o ver não podia deixar passar a vontade de o tocar!

Lá estava ele, deslumbrante e nada negro….

Ele chama-se negro porque é mais escuro do que outras águas de outros mares ou cursos de água, uma coloração escura provocada pela composição das suas águas e da vegetação submarina que existe nele. Dizem que as suas águas são menos salgadas que as do Mediterrâneo e outros mares! Ao mergulhar soube-me a água salgada na mesma, teria de ir num instante ao Mediterrâneo provar as suas águas para comparar!

Pousei a moto, rapei da toalha e fui nadar! Eheheh

As pessoas ficavam a olhar para mim e para ela com admiração, contei que ninguém lhe tocaria e assim foi! Ela impôs respeito pois então!

As praias eram deliciosas e a água fresca! Àquela hora da manhã já estava calor suficiente para a frescura das águas ser tão bem vinda!

Que bem que me soube! Num bar em frente à praia fizeram-me uma festa quando fui mudar-me, ninguém falava língua que eu entendesse mas fartaram-se de me dizer coisas, de me cumprimentar levantando o polegar no ar, presumi que eram gestos de admiração… (se fosse de desaprovação levantariam o dedo médio, não?)

E segui fresca e revigorada por terras com nomes muito curiosos, em percursos desorganizados! Fui por onde me apeteceu, dando voltas sem sentido, apenas para ver e espreitar um pouco do que houvesse no meu caminho, porque não queria parar muito, mas queria pôr o olho ao país pois quero lá voltar com mais tempo, um dia!

Fui ter a uma saliência no mapa sobre o mar em Kavarna, um sítio histórico num local deslumbrante!

Ao chegar lá havia uma cabine com um rapaz a cobrar bilhetes! Oh valha-me Deus que não tenho dinheiro do vosso para pagar! “Oh, I don’t have noney to pay you!” ele ficou a olhar para mim, sorriu e fez-me sinal “No problem, go on!” fiquei espantada a olhar, enquanto ele me mandava seguir! Gente boa!

E fui explorar ruínhas daquelas que eu gosto tanto! Kavarna foi fundada no séc. V aC pelos gregos e eu queria ir ver como era o que chegou até nós…

Dali a perspetiva sobre o mar é um espanto! Momentos espantosos!

Ali dentro há uma propriedade militar e as ruinas de séculos e séculos de história, mas foram as pessoas que me encantaram! Olhavam-me com espanto, eu ia toda vestida de preto e isso parecia atrair as atenções! Então eu sorria para elas e elas abriam grandes sorrisos também! Não há nada que um sorriso não derreta!

Nada podia comprar porque continuava a não ter dinheiro, o lev nunca chegou a entrar no meu bolso, ou acabaria por trazer mais moedas de sobra no fim do caminho! O que comprei e paguei na Bulgária foi sempre com cartão, mas ali não havia multibanco!

Então uma senhora ofereceu-me água! Genial! Gente tão simpática!

Estive por ali sentada a apreciar a paisagem e a curtir a companhia das pessoas, que estavam muito preocupadas porque eu estava tão perto do penhasco e o chapéu podia ser levado por ali abaixo pelo vento!

Mostrei-lhes que o meu chapéu tem um elástico que me permite prende-lo à cabeça quando está vento! Ah as caras das senhoras espantadas como quem diz “Claro! Por isso está ai em cima tão direitinho com este vento!” e riam-se!

Acabei por fazer um desenho no local, com elas a olhar! Eu nunca faço isso, normalmente desenho “em privado” mas ali apeteceu-me e elas adoraram, sacaram todas dos telemóveis e tiraram-lhe fotos!

Ainda tive direito a uma mão cheia de figos e uvas e tudo! E fui embora com um sorriso enorme porque encontrar gente boa faz tão bem ao coração!

Segui pela berma do mar, mas a minha finalidade era seguir para Bucareste sem parar mais! Há momentos em que só me apetece seguir caminho e a minha obrigação é atender aos meus próprios desejos, mais do que a roteiros ou planos pré-estabelecidos!

E começaram a aparecer as placas que eu esperava! Wow!

A fronteira passou-se na maior paz e serenidade! Cheguei, espantei e segui! Apenas mostrei a capa do meu passaporte e ninguém me incomodou mais, afinal estava na comunidade Europeia de novo!

Achei a operação tão simples que fiquei um pouco ali a olhar para uns e para outros, enquanto a fila dos carros não andava nem desandava. Dois polícias deram a volta à moto e fizeram-me sinal levantando o polegar! Adoraram a moto e parece que adoraram ter uma cliente feminina por ali. “Your friends?” perguntou um “My friends are in Portugal! I’m here alone!”

Adorei o seu “Alone?? Wow! Go on and enjoy our country!”

E o mar Negro era cada vez menos negro, e voltou a apetecer-me mergulhar nele!

Constanţa tem as placas de sinalização da cidade mais originais que encontrei! Enormes barcos marcam a entrada e a saída da cidade!

Apenas dei voltas pela cidade sem desmontar da moto. Ali era o ponto em que eu deixaria o mar Negro para trás e seguiria para o interior do país até Bucareste!

As capelinhas nas bermas das estradas fascinaram-me! Pequenas joias ali, abertas, onde toda a gente podia entrar e, mesmo assim, perfeitas e limpas! Isto mostra muito de um povo que pode entrar e estragar mas respeita! Lembrei-me de quantas capelinhas, bem menos interessantes, existem por cá e estão fechadas a 7 chaves contra o vandalismo!

Então, se calhar, aquele país não está assim tão entregue a gente duvidosa como se pensa frequentemente por cá…

A minha bonequinha em solo romeno! Fica tão bem!

Uma coisa que me despertava o interesse era a arquitetura daquele país e foi aparecendo um pouco do que desejava! Ah aqueles telhados!

De repente a vontade de chegar à capital era grande, queria lá chegar de dia e vê-la naquele dia ainda! Por isso corri!

E de repente deixei de me sentir uma perfeita analfabeta, que nada consegue ler, e consegui entender que havia ali uma autoestrada sem portagens! Boa, segui por ela!

O romeno é uma língua latina por isso consegue-se entender muitas coisas escritas, sobretudo!

E cheguei a Bucareste!

Cidade grande e grandiosa! Cidade espantosa, de trânsito ordeiro, motards simpáticos e estradas limpas! Afinal onde está a Roménia porca, decadente e cheia de ciganos? Certamente fora de Bucareste, porque ali eu sentia-me numa cidade demasiado ordeira!

Que falta me fez conduzir por aquelas avenidas como em Istambul! Ui, seria uma alucinação! Mas tive de seguir calmamente em fila e sem furar muito pelo meio do trânsito que ali parece que não se usa muito…

Uma cidade monumental sem buracos por todos os lados, ou sequer obras a perturbar a paisagem ou a condução!

Quando fui a um minimercado comprar comida para fazer um picnic encontrei gente conhecida no teatro em frente! Que bem que soube!

Como é possível passear por uma cidade daquelas sem encontrar obras por todo o lado? Eu nem sabia que isso existia!

E lá estava a grande avenida que leva até ao extraordinário parlamento! Linda!

Parei ali a moto e não havia ninguém parado fora do lugar! Não havia segundas filas nem transito embaraçoso por todos os lados!

Lá estava o parlamento! O famoso que eu não visitei mas terei de o fazer quando lá voltar! Afinal é o palácio maior do mundo depois do Pentágono, disseram-me lá e confirmei na net!

Está no Guinness, no entanto, como o maior, o mais caro e o mais pesado edifício administrativo do mundo!

Está decidido tenho de lá ir vê-lo por dentro um dia destes!

Acabei o dia junto de um bando de artistas de rua que faziam um grafiti na parede degradada de um edifico bem interessante! A solução de pintar aquela parede pareceu-me genial. Eles eram apoiados e tinham direito a grua e tintas e tudo! Ui, o que me apeteceu meter a mão na obra! Foi um serão agradável com direito a comidinha e cerveja e tudo, juntei o meu picnic ao deles e fizemos uma festa!

E foi o fim do 26º dia de viagem!