9. Passeando pelos Balcãs… – La Spézia, San Gimignano, Siena, Rimini

5 de agosto de 2013

Haveria muita coisa que eu gostaria de ver no meu caminho… há sempre!

Mas não voltei a Florença, nem a Pisa, apenas segui por onde tinha traçado o meu caminho. Por vezes dá jeito ter um percurso pensado para que não fique ali, como o tolo no meio da ponte a querer seguir todas as placas.

Afinal, se tudo correr bem, não faltarão oportunidades para voltar a Itália e catar mais um pouco ou voltar a sítios já antes visitados! Por vezes perguntam-me como giro o que quero ver quando afinal queria era ver tudo! Giro assim, com a promessa dentro de mim de que vou voltar!

Quando a gente faz uma viagem de vez em quando poderá ter essa dificuldade, de saber o que ver, porque não sabe quando voltará, mas Itália começa a ser uma daquelas terras que eu nunca visitei de fio-a-pavio mas onde passo tão frequentemente e por tantos trajetos diferentes, que já é um dos países que mais visitei e de que conheço mais!

Não havia nada de especial que eu quisesse ver em La Spézia, mas não resisti a ir ver uma construção religiosa muito interessante e bizarra que me apareceu na berma da estrada!

Uma igreja redonda, no meio dos prédios, ou mesmo em cima deles!

Descobri que é a Cattedrale di Cristo Re, (não sabia que eles diziam Re e não Rei!) que foi projetada nos anos 20 mas apenas consagrada nos anos 70, depois de muita lavoura, de guerras, atrasos, reestruturações do projeto inicial, e vários arquitetos se debruçarem sobre ela!

A construção é redonda e sem janelas visíveis, o que provoca uma luminosidade curiosa e inspiradora!

Há dois tipos de igrejas/catedrais que me fascinam, as muito antigas, desde o início da cristandade até ao final do gótico, e as muito modernas, para a frente do final do séc. XIX início do séc. XX! No entretanto, entre umas e outras, as renascentistas, barrocas e tal, são interessantes mas não me provocam as mesmas sensações… manias!

Tem no meio do teto, aquilo a que eles chamam um olho, extraordinário! E a sensação que provoca é única!

E siga para San Gimignano!

Há muita coisa que eu ainda quero visitar na Toscana e uma delas era esta terrinha medieval, com as suas torres que lhe dão o nome de Cidade das Belas Torres!

A cidadezinha estava cheia de gente, o calor era insuportável e havia momentos em que eu não tinha mais a certeza se queria visitar a cidade, ou andar de moto ou deixar-me cair para o lado! Acho que parei em todas as esplanadas para beber mais qualquer coisa, a cada vez que os meus miolos pareciam ir começar a fumegar!

Realmente as torres são muitas por ali, a gente pode vê-las em todas as praças a espreitar lá de cima!

A Praça Cisterna tem o poço no meio e os turistas entretêm-se a atirar moedas lá para dentro!

Fez-me lembrar o guia do Palácio de la Aljaferia em Saragoça que, junto ao poço Da Torre do Trovador, dizia que os turistas adoram atirar moedas para todos os poços que encontram, por isso se alguém o quisesse fazer e não tivesse moedas ele aceitava cartão de crédito! Eheheheh

E é verdade e quase patético, encontram-se moedas em tudo o que é poço, lago, ou pocinha de água por essa Europa fora!

Tinha de seguir o meu caminho porque, apesar de tudo, era menos penoso conduzir moto do que caminhar debaixo de 40 tórridos graus de temperatura! Ao longe podiam-se ver as torres irregulares da cidade!

Ainda parei em Siena!

Estava a precisar demais de voltar a beber qualquer coisa!

Por aqueles dias eu já quase não comia durante o dia, apenas bebia, bebia e voltava a beber! A sensação de que a água aquecia rápido demais fazia-me parar a cada momento para a beber antes que ela aquecesse, lá trás na mala, que mais parecia um forno.

Siena, aquela cidade tão antiga que a sua história quase se perde na história! Fiz amizade com um pintor de rua que estava a pintar uma imagem religiosa no chão.

O sol ajudava a valorizar as cores e a tornar a obra mais viva e interessante, mas estava a torrar os miolos ao homem!

Depois é caminhar pelas ruas antigas e estreitas, com praças que se abrem rodeada de construções que são autênticos monumentos grandiosos e que estão por todos os lados. Aliás, a cidade é conhecida por isso mesmo, pela harmonia e magnificência da sua arquitetura que faz do seu centro histórico um autêntico museu ao ar livre!

E de repente, por umas “portas” aparentemente pequenas, entra-se na grande e ampla Piazza del Campo, com o Palazzo Pubblico e a sua enorme torre ao fundo.

Parei logo ali a tomar uma grande cerveja gelada à sombra! A paisagem e a possibilidade de apreciar detalhadamente o que me envolvia justifica perfeitamente a fortuna que uma cerveja custa por ali!

A Torre dei Mangia tem 88 metros de altura e as suas paredes têm 3 metros de espessura mas, o que me fascinou mais foi a história do seu nome! Dizem que ela deve o seu nome à alcunha do seu primeiro guarda “Mangiaguadagni” que gastava tudo o que tinha em comida!

Como eu entendo o senhor!

Isso fez-me lembrar quando há uns tempos eu dizia que gastava tanto para comer sozinha como uma família de 3 ou 4 pessoas e que, se eu engordasse na proporção do que como, já não caberia nas portas! Eheheheh

Fui ver aquilo de perto mas estava decidida a não entrar para ver interiores!

Por isso pus-me a apreciar o pátio interior e a brincar com perspetivas vertiginosas!

Uma guia giríssima, vestida como uma princesa, com uma sombrinha rendada prendia mais a minha atenção que a do grupo que lhe pagava os serviços!

Diz a lenda e a mitologia romana que Siena foi fundada por Sénio, filho de Remo, e isso é visível pela cidade já que há estátuas, gravuras e relevos representando os irmãos Romulo e Remo a serem amamentados pela loba, por todo o lado, como acontece em Roma.

A catedral estava cheia de gente, à fila e ao sol para a visita! Eu, ao sol, para visitar o quê? Nem pensar! Estão 40 graus e eu não morro por visitar coisa nenhuma! Por isso olhei-a por fora, debaixo de uma sombra, e mais nada!

A catedral é lindíssima, em gótico italiano, com os mármores policromados e tal, mas terei de a visitar noutra altura…

Bebi mais uma garrafa de água gelada por ali, a minha barriga já chocalhava com tanta coisa que eu já bebera, e segui pelas sombras nas ruelas estreitinhas da cidade.

Claro que ao chegar perto da moto já estava a morrer de calor e de sede de novo! Fui a uma lojita comprar mais uma garrafa de água. Não consegui abri-la, agarrei com a mão direita e torci com a esquerda e não consegui… voltei lá dentro e pedi ao senhor que ma abrisse! Ele ficou estupefacto “Então você conduz aquela moto grande e não abre uma garrafa de água?” – exclamou!
“Pois é, tenho a minha mão direita doente!” – expliquei eu e mostrei o meu dedo polegar inchado e paralisado. O homem ainda ficou mais escandalizado “E vem de tão longe com a mão assim naquela moto?!” – e arregalava os olhos incrédulo. “Não tem problema, eu consigo conduzir assim só não consigo abrir uma garrafa de água, mas isso não falta quem faça por mim!”

Segui viagem rezando dentro do meu capacete, que mais parecia um forno, por um pouco de ar fresco!

“Valha-me Deus oh S. Pedro, manda-me um pouco de ar fresco antes que eu morra esturricada!” – cantarolava eu dentro do capacete, quando estava mais fresco lá dentro, com a viseira fechada, do que cá fora!

Estranhei o céu azul, que parecia meio basso mais ao longe. Será nevoeiro? Isso é que era fixe desde que fosse fresco! Mas claro que não devia ser nevoeiro, afinal o céu mantinha-se azul, apenas basso, fosse pelo que fosse.

Mas qualquer dúvida foi imediatamente esclarecida à medida que fui andando! Grossas pingas começaram a cair, como torpedos em cima de mim! “Chuva?” sim cada vez mais forte, pingas que “enchiam baldes”!

De repente entendi que, ou parava para guardar a maquina fotográfica, ou iria expô-la a um banho. E assim foi, parei na berma da estrada e, tão depressa guardei a máquina, começou o diluvio! Chuva tão intensa que em breves momentos me molhou toda, enquanto eu vestia o blusão. Oh que bem que soube, a temperatura desceu vertiginosamente e a rua virou um pequeno rio. Eu quis dançar no meio da rua!

O céu não deixou de ser azul, a nuvem mijona não era negra, a temperatura desceu para os 23 graus e eu segui caminho naquele temporal surrealista!

Uns 10 ou 15 km à frente tudo era sol e calor, voltei aos 40 graus e tudo secou em mim, como se nada tivesse acontecido!

“Oh S. Pedro, se realizas assim os sonhos de quem te pede vou recorrer mais vezes a ti!”

Cheguei a Rimini ao entardecer, onde um ambiente noturno de praia me esperava, numa festa constante. O hotel era gerido e assistido por pessoal russo muito simpático que me tratou muito bem e acomodou a minha motita nas traseiras do edifício, longe de olhos curiosos.

E fui-me encher de comida pois começava a ter receio de ficar fraca de apenas beber e pouco comer!

Aquela terra é uma animação de música nas ruas e esplanadas e montes de movimento! A noite estava bem mais fresca e agradável que o tórrido dia, por isso deixei-me estar por ali a curtir o ambiente e a falar com uns e com outros!

E foi o fim do 7º dia de viagem.

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7. Passeando pelos Balcãs… – Sisteron, La Spézia

3 de agosto de 2013

Naquele dia… tirei o dia para andar de moto!

Eu tinha dias destes nos meus planos, em que o que eu queria ver a seguir seria longe, por isso estava preparada para passear, para curtir a paisagem e as curvas da estrada de montanha, mas também para correr um pouco!

São estes dias, e tive alguns nesta viagem, que desentorpecem os meus sentidos e os da motita, depois de voltinhas a baixa velocidade por aqui e por ali.

Mesmo assim faço tudo sem stress, não há-de ser porque o meu destino é mais distante que eu desatarei a correr sem olhar para os lados. Cada dia é percorrido como se fosse o único da viagem, com todo o interesse e prazer de condução e passeio, parando sempre que me apetecer, para ver, fotografar, desenhar ou comer. Se se fizer tarde e chegar ao meu destino durante a noite, tanto pior, o meu Patrick GPS que faça o seu trabalho e me leve à porta de “casa” e se não o souber fazer… logo se verá!

Por isso ainda me dei ao luxo de andar para cima e para baixo no mapa e de tirar algumas fotos de montanha, quando o prazer foi em altitude e curvas alucinantes!

Para mim passear pela montanha, neste caso pelos Alpes, é, só por si, um delicioso encanto! Não precisa de ter nada mais para eu ser feliz!

À luz da manhã é que pude ver direito onde dormira, rodeada por montanhas extraordinárias!

E descobri também que ficava na “Route du Temps”, um nome bem sugestivo para um percurso perto do céu e a tocar o paraíso!

E mais à frente já se via o imenso vale onde se situa o penhasco de Sisteron.

Sisteron, entre a rota da grande produção de fruta e a rota da lavanda!

A cidadezinha não é tão encantadora como eu pensava! Quando a vemos de longe, com o penhasco encimado pela cidadela, temos a sensação de que é toda construída em pedra, com ruelas estreitas e onde os carros não podem entrar… e em parte é!

Mas tem também estradas cheias de carros e movimento e confusão, e as casas são cinzentas e o chão alcatroado ou de cimento!

Não me apeteceu subir até à cidadela, estava muito calor e tinha de subir ainda muito…

A perspetiva da cidade era muito interessante lá de cima. Sisteron, uma cidade cheia de história antiga que se estende desde os romanos, testemunhando todos os grandes momentos históricos do país, por se situar em ponto tão estratégico e de passagem obrigatória para tantos destinos!

Preferi passear-me pelo mercado de rua e deixar explorações mais profundas para uma visita posterior!

Eu queria ir a Castellane e à Gorge de Verdon, mas aquilo estava impossível de povo irrequieto por todo o lado! Tive de me obrigar a deixar para outra vez, quando eu programar passar ali a noite e visitar a garganta de manhã, porque naquele momento era impossível! Por isso amuei e segui até Rougon.

Subi até à aldeiazinha e, ao menos lá, não havia ninguém para além dos locais! Foi um alívio e uma pausa na paz!

Com os montes “rachados” como paisagem, os mesmos que se abrem para Verdon!

Eu tenho mesmo de ir explorar aquilo direito, pois se o rio Verdon é deslumbrante no seu percurso mais banal, nas gargantas deverá ser realmente extraordinário, com as águas turquesa e os penhascos a pique em seu redor!

E seguindo percursos de água logo a seguir fica o Lac de Castillon, provocado por uma barragem e cheio de beleza, com as suas águas turquesa com barquinhos a passear em cima!

E tinha de tratar de atravessar os Alpes para descer para Itália.

Estava numa zona cheia de passos de montanha interessantes, lá fui andando de curva em curva pelo Col d’Allos até aos 2.250m de altitude.

Há momentos em que a gente olha para o caminho percorrido e ele parece que está por todo o lado!

Entrei em Itália por uma das minhas fronteiras preferidas!

Pertinho de Barcelonnette, onde a seguir ao lago muito bonito fica a estrada extraordinária com este aspeto!

Depois vem mais montanha, estamos em Argetera.

E começa a confusão dos vilarejos e aldeolas, sem muito o que ver mas com muito transito e camiões à mistura!

É este ponto um dos únicos nas minhas viagens em que eu gosto de apanhar a autoestrada, pois é uma alucinação! Sempre que vou por aqueles lados passo ali da estrada nacional aborrecida para a autoestrada mais louca que se pode desejar! As velocidades variam entre os 80km, nos troços mais lentos e sinuosos, para os 130km/h nos mais rápidos e a gente parece que anda num carrocel, ladeado de paredes, repleto de curvas e com os carros a competir connosco! Adrenalina pura!

E cheguei a La Spézia, onde ficava a minha casa naqueles dias!

E foi o fim do 5º dia de viagem!