4 de agosto de 2013
A minha ida a La Spézia tinha uma única finalidade… que afinal eram cinco!
Fui para ali para visitar as Cinque Terre! Dizem que aquelas terras se visitam de barco, porque se tem perspetivas únicas sobre elas mas, como eu costumo dizer, quem decretou isso, provavelmente nunca as fez de moto senão mudaria um pouco o seu discurso, do tipo “As Cinque Terre visitam-se de barco ou de moto!” e aí sim, eu assinaria por baixo!
Estas cinco aldeias piscatórias, estão encravadas na encosta rochosa e ingreme da costa, com poucos acessos e as praias sem areia! Tudo é pedra e água por ali! As ruelas que levam a cada uma, e de umas para as outras, é ziguezagueante, deformada, como eles avisam, e por vezes em muito mau estado já que as intempéries mais invernosas as vão destruindo com enxurradas de água que corre violentamente pela encosta até ao mar.
Decidi começar pela mais longínqua em relação a La Spezia. Entenda-se que este “longínqua” se refere a apenas 32km de distancia! E fui até Monterosso Al Mare, depois viria de terra em terra até chegar de novo a La Spézia!

Os enquadramentos encantadores não se fizeram esperar! O mar ao fundo e as montanhas logo a seguir, sem dar tempo a procurarmos pelas praias pois elas não existem!

A vantagem de se ir por terra e de moto é que a qualquer momento a gente encosta um pouco e apanha perspetivas espantosas da costa!

Por isso bem antes de chegar ao destino eu já conseguia vislumbrar a cada curva do caminho a aldeia que queria visitar!

Ao chegar-se lá, pousa-se a moto no meio da multidão de scooters e toca a caminhar por entre o casario vertiginoso e colorido! Aquilo é mesmo bonito porque não é feito para turista ver, é como as pessoas fizeram que fosse ao longo dos tempos e agora a gente vai lá ver!

Uma das coisas que me encantou por ali foram as cores vivas, quase berrantes por vezes, e o ar de “normalidade” que tudo tinha, desde pessoas que lavam e esfregam na rua até barcos “estacionados” na berma do caminho, encostados às casas, com toda a naturalidade!

Gente muito religiosa, as igrejas às risquinhas estavam cheias àquela hora, com povo devoto a enche-las, apesar do calorão que se fazia sentir lá dentro! Estava bem mais fresco cá fora!


Então chega-se à Piazza Garibaldi e logo a seguir fica o mar e aquele é o único areal nas cinque Terre! Ainda estava vazio, nem todo o turista e banhista se levanta cedo como eu!

Andei por ali de nariz no ar, pois muito do encanto está nas casinhas encavalitadas que quase se tocam lá no alto!

A aldeia seguinte seria Vernazza.
Segui o seu caminho e a dada altura conseguia já vê-la e tudo mas, de repente a estrada estava cortada! Andei por ali a experimentar pois por vezes até dá para uma moto passar, mas a dada altura não havia mais estrada! Tinha desaparecido de todo e restava apenas um caminho muito manhoso e extenso, cheio de buracos, cascalho e descidas ingremes!

Não meti ali a moto! O meu problema não era só o ir por ali abaixo, era também o regressar e subir aquilo a pique com uma moto de 320 kg a resvalar! Por isso tentei uma outra ruela, que também anunciava que estava cortada mais à frente! Estava melhor que a anterior mas nada fácil de fazer com a minha Ninfa, por ser muito extensa, irregular e esburacada para além do cascalho, por isso fiquei ali a decidir se devia ou não arriscar.
Então apareceu um fulano numa maxi-scooter, ficou um bocado a olhar e propôs, eu ajudava-o a passar e depois ele ajudava-me a mim! Boa, assim já arrisco, disse eu!
Ora o homem mete-se por ali fora, eu a segurar a moto pela traseira e nem assim ele a segurou e pimba, no meio do chão!
“Mas então você não sabe andar fora de estrada?” – perguntei eu
“ Nunca andei pois tenho um medo de morte!”
Oh valha-me Deus, e vem-me com propostas de ajude-me ai que eu passo? E o pior de tudo, não tinha força para levantar a moto do chão, fui eu quem fez o maior esforço senão ele ainda lá estaria hoje a puxar por ela!
Bem, se nem com a tua podes como poderás com a minha?
Peguei na minha motita e fui mas é dar a volta a todo o circuito e tentar chegar a Vernazza vinda de Lá Spézia. Se desse veria a terrinha, se não desse veria as outras todas e pronto!
E ainda me dizem que eu não devo viajar sozinha, e seria melhor levar alguém assim, que em vez me ajudar teria de ser ajudado por mim?

Voltei aos bons caminhos porque por ali as ruínhas são muito bonitas… quando não estão todas lixadas!

Voltei a la Spézia e, quem vai dali pode fazer a via panorâmica que nos permite ver toda a cidade com o porto e a montanha ao fundo!

Julgo que é o ângulo mais bonito para se apreciar a cidade!

E lá estava a primeira aldeia para quem vem da cidade: Riomaggiore

Tão visível lá de cima que fiquei ali debruçada sobre a berma a aprecia-la!

Mais uma vez a gente deixa a moto junto à multidão de motos e scooters e vai por ali abaixo, pelas ruelas estreitas, apreciando perspetivas deliciosas do conjunto!


A casa do Município estava toda pintada com murais de mar e mitologia muito bonitos! Espero que estejam a pensar restaura-los pois a tinta começava a estalar!

E as ruínhas e caminhos por entre as casas, com degraus e passagens cobertas por elas, mais pareciam entradas particulares!

Quando o calor era já insuportável e o sol ameaçava torrar-me a mioleira… o mar apareceu ao fundo de um caminho estreitinho por entre casa! Oh visão do paraíso!

Meio como quem se precavém para o que não vai acontecer e se prepara para o que não vai fazer, eu pusera o fato de banho na bolsa de cinta, muito enroladinho… e agora ele berrava por mim lá dentro!

A frescura das águas berrava também por mim! Mas como fazer? Não havia condições de vestir o fato ali perto e ir para a água!
Então uma senhora provocou-me “vá nadar!” ao ver-me ali tão sôfrega a olhar para o mar “não tem fato?” sim tenho, tirei-o da bolsa e mostrei-o, mas como o visto por aqui?
Italiano é desenrascado como português! Então ela chamou a filha (acho eu) e, depois de catarem nos sacos, deram-me um vestido de alças, daqueles que eu nunca usei na vida, tipo franzido no peito e solto e comprido até aos pés, e disse-me para eu me trocar dentro dele!
Oh santinha, vou pôr uma velinha por ti em algum lado!
Deixei-lhes as minhas coisas a guardar e fui nadar! Saltei direta do penhasco para a água como os miúdos estavam a fazer! Huuuuuum delicia!

No fim nem precisei me limpar, vesti a roupa por cima do fato molhado e fui passear pela aldeia com o rabo molhado ainda! Que bem que soube!
A senhora ficou minha fan, falamos um bom bocado de onde eu vinha, para onde eu ia e, no fim, deu-me o vestido, para que eu não morresse de calor onde houvesse mar, porque a Itália estava sob uma vaga de calor muito forte! Mas não era só a Itália, era toda a Europa e o vestido veio a revelar-se útil noutras situações semelhantes!


É nestes momentos que eu acho que deveria comer um gelado, que era o que toda a gente fazia por ali… mas tive de me reduzir a muita água e alguma cerveja já que não gosto de gelados…

Estavam 39/40, tudo irradiava calor e um pormenor me enterneceu! A cada fonte, a cada chafariz, uma taça estava disponível para dar de beber aos animais! A princípio pensei que era da loja ao lado, para o seu cão, mas depois percebi que era para toda a gente pois existiam em todos os pontos de água! Um gesto tão simples e tão grandioso! Quanto cão e gato vi ser saciado e quantos ficavam ali à espera que alguém lhe enchesse a pia! Lindo!

E segui para Manarola que é logo à frente!

O mesmo clima, o mesmo ambiente, o mesmo calor, o mesmo mar e um novo mergulho!

Ali eu já fui direta à água! Tinha o fato vestido, foi só tirar a roupa, meter tudo dentro do chapéu e entregar a uma velhota para cuidar!

Lá de baixo eu via a velhota a espreitar, pensando com os seus botões que eu devia bater muito mal!

Só não tinha levado a toalha comigo, tinha ficado na mota, mas também não fazia falta, com todo o sol e calor que estava até sabia bem secar o corpo ao ar!


Aquela vidinha já estava a fazer fome e fui comer um peixinho aos pacotes ali perto, que me tinha chamado tanto a atenção! Uma fritada deliciosa!

Podia passar por ali todas umas férias! Que perfeito ambiente!


E segui pela costa apreciando as terrinhas encavalitadas nos extremos dos penhascos com vista privilegiada para o mar!


Vi Corniglia ao fundo, para mim a menos interessante das 5 terras!


Ali foi só para beber mais qualquer coisinha que o calor estava a sacar toda a água de mim e eu tinha de repor o stock!

As ruelas estavam cheias de gente a lambuzar-se de gelados!

E a minha motita a espantar toda a gente no meio das colegas mais pequenas!

Finalmente voltei a aproximar-me de Vernazza, aquela que estava inacessível pelos caminhos lá de cima, deixou-me aproximar pelo caminho que vinha de Corniglia! Maravilha!
Ao aproximar-me da aldeia pude perceber a dimensão do estrago nas ruas de acesso! Entendi então que se tivesse persistido em desce-las poderia mesmo ter-me virado de pernas para o ar, porque o estrago era muito grande e muito extenso e as obras estavam a decorrer até à entrada da aldeia, com direito a terra, pó e buracos com fartura!
Entrando na aldeia, era a paz e a alegria!

E mais multidões a comer gelados por todos os lados!

Oh mar bendito, depois da caminhada, da poeirada e do calorão… claro, voltei a tirar a roupa, a meter tudo dentro do chapéu, a dar a uma velhota para guardar e pimba, mar!

Eu já nem me preocupava se me iriam roubar a maquina fotográfica ou a bolsa, eu só pensava no fresquinho da água!

Pela aldeia as pessoas faziam filas para encher as garrafas de água nas fontes! Eu sentia-me fresca, com o rabo ainda molhado do banho e uma cerveja fresquíssima a acompanhar!

E fui passear um pouco, que não sou pessoa de ficar horas num lugar a apanhar sol e calor!


La Spézia lá estava com o pessoal simpático do hotel que se fartava de falar comigo e achava graça à pronúncia portuguesa e se punha a encontrar semelhanças entre as duas línguas!


E foi o fim do 6º dia de viagem!