75 – Passeando até à Suíça 2012 – A França – Le Viaduc des Rochers Noirs, le Château de Val, Sarlat-la-Canéda…

5 de Setembro de 2012

Cada manhã, cada dia tinha cada vez mais o sabor do regresso. Havia tanta coisa para ver, o tempo era tão pouco e a distância tão longa! Por muito longas que sejam as viagens a mim vão-me parecer sempre pequenas para tanta coisa que há para ver!

Segui por caminhos e estradinhas secundárias, deixando-me levar pela nostalgia do caminhar para casa…

Havia algumas coisas que eu queria ver e fiz um caracol no mapa antes de descer para Pau onde pernoitaria a noite seguinte.

Na maison d’hotes, onde eu ficara aquelas duas ultimas noites, perto de Tulle, falaram-me de algumas curiosidades da zona, entre elas o Viaduc des Rochers Noirs, uma ponte histórica que, segundo a narrativa dos locais, nunca foi destruída pelos bombardeamentos nazis, por milagre!

Aquela ponte foi usada pelas pessoas da Resistência com o apoio da população, que as avisava se podiam ou não passar usando velas que acendiam nas janelas! Soube também que fora construído em 1918 para uso exclusivo de comboios e só em 1959 foi encerrado a todo o trânsito e ficou exclusivamente pedonal. É monumento nacional e naturalmente eu quis vê-lo de perto!

Passei lá de manhã cedo, antes de seguir para sul. Era cedo, estava sol, o dia perfeito para uma visita histórica… fotografei-o lá de cima do topo da encosta, na berma da garganta que ele atravessa, depois desci até ele e… havia polícia lá em baixo, e bombeiros e ambulâncias… Um polícia veio ter comigo, comunicou-me que não poderia aproximar-me do viaduto. Disse-mo num tom quase pesaroso. Perguntei-lhe o que se passava ali… “um homem se suicidou aqui há apenas alguns minutos…” respondeu-me ele. Um frio percorreu a minha coluna. Uns minutos antes e poderia ter sido eu a encontrar o corpo! Olhei com mais atenção e vi o corpo no meio da rua mais à frente. “não há problema” disse eu ao policia “eu vou embora, não vou perturbar o vosso trabalho”… tirei uma foto discreta ao viaduto… e parti….

O choque da situação acompanhou-me por um tempo, enquanto fui rolando quase ao acaso. Só hoje me pergunto como seria atravessar o viaduto a pé e fotografar o abismo por baixo! Limito-me a ver imagens da net e pensar se lá voltarei a passar um dia!

Lá acabei por me ligar à terra e direcionar o meu caminho para o Château de Val.

O Château de Val é um castelo encantador do séc. XIII que foi construído e transformado até ao séc. XV.

Não tinha qualquer espirito para me pôr a visitar castelos, por isso limitei-me a passear por ali e tirar um milhão de fotos, porque o castelinho é mesmo encantador!

Fica na borda do lago de Bort-des-Orgues, bem pertinho de Tulle e podiam-se ver barcos de recreio oferecendo passeios turísticos pelo lago.

Mas nada disso me apetecia. Sentei-me no murito que separa a praia do nível superior, junto às árvores, e fiz um desenho giro do castelo!

O cenário que o enquadra propicia fantasias românticas e históricas e já foi utilizado em vários filmes, entre eles uma versão francesa de “Frankenstein”.

Ao passear-me ali, pela praia, lembrei-me de uma ideia antiga de visitar todos os castelos medievais que encontrasse por terras francesas! A atmosfera que se vive junto de uma construção tão fantástica como esta fascina-me tanto como a atmosfera de uma catedral medieval…

As ruínhas continuavam deliciosas! É a parte que mais gosto de estrada de uma viagem, quando me meto por caminhos de ninguém, onde apenas os locais circulam!

E ao dar a volta e voltar a uma rua “decente” lá estava o castelinho ao longe!

Claro que fiz uso do meu novíssimo zoom de 20X para o “apanhar”! Que coisinha fofa!

Mais à frente vi ao longe o Château de Salignac… e tive vontade de ir vê-lo…

Parei um pouco na berma da estrada a olhar para ele. É medieval, é lindo e está na minha lista de futuras visitas, pois já vi que a cidade que o alberga, Salignac-Eyvigues tem todo o ar de ser linda!

Às vezes é nestas breves paragens na berma da estrada que reside o motivo para uma próxima viagem!

Segui para Sarlat, que por aquelas bandas parece que os nomes das terras terminam sempre em “at!”

Sarlat-la-Canéda é mais uma cidade medieval apaixonante, como parece que é tudo por ali pela região do Dordogne! Ok, a bem dizer todas as regiões são bonitas por ali!

O centro histórico é grande e grandioso! Um dos maiores conjuntos medievais do mundo, composto por uma rede intrincada de ruínhas ladeadas de casas de arenito amarelo, com telhados de ardosia espantosos!

Lá fui entrando numa igreja ou noutra como a igreja de Saint-Sacerdos do séc. XVII

A cada passo a cidade serve de cenário para filmes de época pois presta-se perfeitamente pela grade extensão de espaço medieval intocado!

Muitas outras cidades francesas tiveram centros medievais igualmente espantosos mas que foram sendo destruídos pela modernidade. Sarlat foi a primeira cidade a beneficiar de uma lei/programa, nos anos 60, que incentivava os proprietários a restaurar os seus edifícios contra grande dedução nos impostos, o que permitiu manter a cidade até aos dias de hoje, impecável!

A Ancienne église Sainte-Marie, uma igreja do séc. XIV, depois de ter deixado de servir a sua função, já foi Posto dos Correios, já esteve abandonada durante muito tempo e apenas há 10 anos foi remodelada e transformada num mercado coberto e espaço de exposições! Havia fila à porta para subir o elevador e ter uma vista panorâmica sobre o centro histórico… não fui! Detesto filas!

E as ruelas parecem nunca terem fim, nem os seus encantos!

A fonte de la Vierge Marie foi durante muito tempo o único ponto de água da cidade. Os viajantes refrescavam-se ali e atiravam moedas para a água que os putos corriam a apanhar!

No fundo da gruta está a estátua da virgem!

Ali à beirinha uma motinha pequerrucha tinha ar de ter participado num casamento! Estava toda adornada com papel crepe!

Tudo tão bonito e encantador por ali que não me apetecia ir embora!

E não fui! Tratei mas é de encontrar um sítio bem bonito para me sentar e comer, que estava na hora e, com um ambiente daqueles, eu não iria comer uma sandoca qualquer! Ia sentar-me numa mesa e comer mesmo, usufruir da beleza do local

E lá estava o sítio ideal para me sentar, comer e disfrutar do momento!

Depois tive mesmo de me pôr a andar…

mas a estrada também seria bonita, com palácios e paisagens rurais como eu tanto gosto…

até chegar a Bergerac, a terra do Cyrano, o homem do grande nariz!

(continua)

74 – Passeando até à Suíça 2012 – A França – Tulle, Collonges la Rouge, Martel, Rocamadour, Cahors.

4 de Setembro de 2012 – continuação

Segui para Tulle que ficava logo a seguir no meu caminho! Uma cidade muito antiga e com um centro histórico acolhedor!

Tulle é uma cidade cheia de história, mas a história recente é profundamente triste e violenta e foi uma das razões que me fez lá passar. Nada se vê, nada ficou para contar como foi, mas ali morreu muita gente durante a segunda Guerra, quando as SS torturaram e executaram mais de 200 pessoas, depois do desembarque na Normandia…

A sua catedral do séc. XII é bonita e estava em obras! Cathédrale Notre-Dame de Tulle

Devia ser proibido pendurar porcarias nas paredes e colunas de um edifício histórico como uma igreja!

O altar é uma peça de design muito curiosa, que tem um tampo de vidro que parece que pode irradiar luz! Gostei!

A envolvência da catedral é encantadora e preservada de estacionamento, graças a Deus, embora se veja um carrito fora da lei de vez em quando!

E um dos meus grandes destinos daquele dia era a terrinha vermelha de Collonges-la-Rouge que, conforme o nome diz, é toda vermelha!

Descobri esta aldeia encantadora nas minhas pesquisas e não descansei enquanto não a fui ver de perto com os meus próprios olhos! E não dei a visita como perdida, porque ela é linda!

Uma aldeia antiga numa zona de terras vermelhas que permitem um bom trabalho de cerâmica e que os habitantes unidos trataram de classificar como sítio de grande interesse e hoje está em primeiro lugar na lista das cidades mais belas de França!

Chamam-lhe a aldeia das 25 torres e é totalmente construída em arenito vermelho que lhe dá o nome!

E podem-se ver realmente uma série de pequenas torres por lá!

A igreja do séc. X, linda, como tudo por ali! Na realidade há ali uma concentração de edifícios de diversos séculos desde o século décimo até ao século dezasseis, em perfeito estado de conservação!

O portal da Igreja de Saint-Pierre é uma joia lindíssima, esculpida em pedra branca, no meio de todo o vermelho da igreja e da aldeia!

E a gente passeia-se pelas ruelas encantadoras sem ter vontade de ir embora!

Faltava o sol, mas não faltava o calor e eu aproveitei o belíssimo decor do ambiente para me sentar numa esplanada e tomar uma bebida fresca, disfrutando do privilégio de me encontrar ali!

Na parte baixa da aldeia fica o “Castel de Vassinhasc” construído pela família que lhe deu o nome, no séc. X! Puxa aquilo tem 10 séculos de habitação civil!

E vindo de baixo pode-se ver toda a igreja, com o campanário ainda românico no centro!

A aldeia é um dos locais mais visitados do Limousine e entende-se bem porquê! As pessoas apenas se passeiam de um lado para o outro sem terem vontade de ir embora!

E foi um dos poucos sítios que visitei em que as pessoas têm mesmo vontade de fotografar a paisagem, mais do que fotografarem-se a si mesmas em frente a ela!

E foi mais um sítio onde tive vontade de bater às portas e pedir para ver como era uma casa daquelas por dentro!

Depois de umas horas embrenhada em tanta beleza a vontade de visitar muitas mais coisas reduziu grandemente! Mas era cedo para voltar para casa, por isso segui mais um pouco, veria ou visitaria o que me apetecesse e voltaria depois para casa!
E cheguei ao Pays de Martel!

Afinal existem martelos de verdade por aí e são lindos!
Eu tenho de voltar àquela zona para explorar todos os seus encantos, foi prometido naquele dia, ao atravessar tão belos recantos!

A cidade deve o seu nome a Charles Martel, avô de Carlos Magno e o seu brasão tem mesmo 3 martelos!

O centro histórico é lindo e acolhedor, com torres, palácios praças de traçado medieval bem conservados.

O sol, que tinha voltado, tornou ainda mais bonito o conjunto!

É curioso como a cada local cheio de beleza que encontro tenho a sensação que de atingi o ponto alto do dia e a seguir vem outro sítio espantoso e volto a encantar-me!

O Palácio da Raymondie do séc. XIII, tem um museu a funcionar.

Mas ele próprio é uma peça de museu! Ali funciona também o posto do turismo, onde eu me desgraço sempre, pois encho-me de papéis que servirão para desenhar novas viagens, claro!

Um dia passeava em grupo e fui a um posto de turismo. Ninguém quis nada de lá, mas eu enchi-me de papelada, até me deram um saco para eu carregar tudo. Alguém do grupo comentou “montes de papeis para por para o lado lá em casa?” eu fiquei espantada com o comentário brincalhão “claro que não! Tudo o que recolho leio e consulto e volto para visitar logo que posso!” porque é mesmo isso que eu faço!

Ainda seguiria mais um pouco. Mais à frente ficava uma cidade que queria ver… Avistei-a de longe, na encosta do outro extremo…

A encosta da falésia é, ela própria, a “Cité du Vertige” (Cidade da vertigem)!

Diz a lenda que Rocamadour deve o seu nome a “roc amator, amante das rochas”, que um eremita, Zaqueu de Jericó, amante das rochas escavou o seu ermitério naquela falésia!

Na realidade toda uma cidade se desenvolveu em seu redor e lá permanece, “pendurada” no abismo, a cidade da vertigem!

Um deslumbramento olha-la de todos os ângulos do desfiladeiro e sentir a vida que pulsa dentro dela. Um dia terei de lá voltar para a explorar demoradamente, porque é muito para além de bela!

Estava muita gente por lá, não podia deixar a moto à porta, teria de a deixar muito longe e apanhar o comboio panorâmico… Decidi subir o penhasco e ver a cidade de cima!

Há um acesso para vermos a cidade de cima, pelo castelinho.

E de cima eu percebi o quanto a cidade estava repleta de gente, bagunça e aperto!

A perspetiva é deslumbrante ali de cima!

Pus-me a olhar para o relógio, não era nada cedo, tudo estaria fechado ou a fechar! Não valeria a pena ir visitar a cidade numa corrida pelo meio do povo, deixando a moto tão longe! Por isso decidi que voltaria um dia, com tempo e calma e… de preferência menos gente!

Ainda me deslumbrei mais um pouco com aquela “cascata sanjoanina”

E fui gastar mais um pouco de pneu porque as estradas, essas estão sempre abertas!

Ainda passei em Cahors… mas o que seria para visitar estava fechado e o resto cheio de gente, bagunça e trânsito caótico!

A catedral de Cahors, que eu queria visitar por dentro, porque é românica do séc. XI, porque embora tenha já mistura de elementos góticos, mantem o seu aspeto fortificado que tanto aprecio.

Ainda passei pela Tour Jean XXII, a torre do papa que nasceu em Cahors, pois então!

Mas não me apetecia de todo andar no arranca e para de quem volta do trabalho e apinha todas as ruas de uma cidade! Mesmo os passeios estavam repletos de gente e as esplanadas também! Para tanta confusão não preciso de ir para tão longe, fico mesmo pelo meu Porto em hora de ponta!

Dei a volta e sai pelo outro lado muito direitinha, rumo às ruelas rurais que tanto aprecio!

E foi nesse “passo de passeio” que eu voltei calmante passando por pequenas povoações como Thegra, que ficou na minha lista para catar da próxima vez que for passear por aqueles lados, pois há por ali um castelo deslumbrante!

Os castelos, palácios e habitações apalaçadas são comuns por ali!

Parece que estamos a passear pela terra dos livros de contos de fadas!

E cheguei a casa, que naquele dia ainda era em Lapleau…

E foi o fim do trigésimo sétimo dia de viagem…

73 – Passeando até à Suíça 2012 – A França – Gimel les Cascades et le Château de Sédières

4 de Setembro de 2012

De manhã um belíssimo pequeno-almoço me esperava! Ui, e como eu gosto de comidinha variada antes de partir! Fiquei a saber, enquanto comia, que por ali pela zona havia uma série de coisas curiosas para ver. Uma das vantagens de se viajar sozinha é que as pessoas falam para mim, dizem-me coisas que me interessam. Quando viajei acompanhada não havia tanta interação, porque a tendência é falar para quem está comigo e as pessoas não se metem na conversa!

Rapei do mapa e tratei de ir ver primeiro o que havia ali na zona, para depois ir mais longe, onde planeara ir.

Eu estava em Lapleau, uma terrinha tão simpática quanto perdida no meio de lado nenhum! Na noite anterior pensei que o meu Patrick (GPS) estava doido ao dizer-me que eu estava a chegar e eu apenas via ruelas estreitas com mato dos dois lados! Mas era mesmo ali, uma pequena localidade, que pude ver no dia seguinte, era bem bonita!

Com direito a igrejinha medieval e tudo!

As casinhas são deliciosas por ali! Apetece bater às portas e pedir para ver como são por dentro!

E o meu destino ficava a uns trinta e poucos quilómetros dali: Gimel-les-Cascades e as suas cataratas!

Curioso que a entrada para o recinto das cascatas faz-se por um café na beira da estrada, onde fica um portãozito sem segurança!

Depois começa-se a descer por caminhos que levam de uma cascata para outra, passando por uma casa que não entendi o que fazia ali!

As cataratas são compostas por três quedas sucessivas do rio Montane de uma altura total de 143 metros: Le Grand Saut de 45m; La Redole de 38m e La Queue de Cheval de 60m, esta ultima mergulha no “Gouffle de L’Inferno”, achei piada dizerem “inferno” e não “enfer”.

A primeira aparece logo a seguir à casa do caminho: Le Grand Saut de 45m

Muito bonita!
Cada vez que desço penso que terei de subir tudo de novo! E eu já estava a descer tanto apenas para a primeira catarata!

Depois lá em baixo a gente segue o percurso da água, pois a catarata seguinte estará mais à frente.

E lá está La Redole de 38m

E tinha eu de descer mais uma infinidade de metros!

Muito bonito o percurso e o ambiente!
Tive a sorte de andar completamente só por ali, o que fez a visita revestir-se de encanto! Não havia ninguém a tentar ser fotografado em frente das quedas de água como me aconteceu no parque de Plitvička Jezera na Croácia, em que as pessoas faziam filas para a fotografia!

Deu até para me sentar um pouco e apreciar o momento!

E cheguei à Queue de Cheval de 60m e ao “Gouffle de L’Inferno”

E comecei a subida infinita, por um caminho em ZZ e com o barulho da água bem forte atrás de mim!

A aldeia, que se chamou apenas Gimel até há poucos anos, hoje chama-se Gimel-les-Cascades e é muito bonita, cheia de história pois é de origem medieval.

O que eu gosto daquelas aldeiazinhas francesas, com as ruínhas muito bem desenhadas e limpas, as casinhas nas bermas parecem projetadas especialmente para conviverem com qualquer época histórica, pois continuam lindas, tantos séculos depois de terem sido erigidas!

E o precipício das cataratas é logo ali! A gente pode mesmo ouvir a água que corre e bate lá em baixo!

Mas havia mais coisas que eu queria ver por aquelas bandas. Segui o meu caminho, ainda afogueada pelo calor da exploração das cataratas, na direção de Tulle, mas o meu destino ficava fora do caminho, uns quilómetros mais à frente.

Começa-se por se passar por lagos e floresta, afinal dizem que são 130 hectares de terreno florestal!

Só o percurso já valia a pena o passeio!

Mas o que eu queria visitar era o Château de Sédières, um castelo medieval encantador do séc. XV, que foi remodelado em estilo renascentista um século depois, e hoje é local de exposições!

Ao chegar ao parque de estacionamento da propriedade, um enorme cão veio na minha direção. Já um dia um cão me pôs ao chão mais a minha moto, por isso não esperei que se chegasse a mim e pus o descanso “que me morda mas que não atire comigo e com a moto!” A dona era uma senhora gorda que o chamou logo. O cão obedeceu e ela exclamou para o jardineiro e para as pessoas que andavam por ali “olhe, o senhor motard não teve medo nenhum da cadela!” mas o seu espanto acabou por se traduzir em grandes gargalhadas quando eu arrumei a moto e tirei o capacete, “é uma senhoraaaa!!!” exclamou ela!

Fez-me uma festa, fartou-se de falar comigo e eu fiz a minha parte conversando outro tanto com ela, enquanto caminhávamos na direção do castelo. Ela vivia ali na zona e ia frequentemente passear a cadela para ali pois é uma propriedade muito bonita e livre de trânsito. Perguntou-me se eu também ia frequentemente passear para lá, pois nunca me vira! Disse-lhe que era a primeira vez pois não era dali. Ficou espantada por eu ser portuguesa “mas você fala o verdadeiro francês!” Percebi que se referia ao francês de França e não ao francês de quem está de passagem!

Fiquei lisonjeada por saber que tenho mais sotaque do norte no meu português, do que de estrangeira no francês!

E lá estava cadela toda contente a enquadrar com o castelo!

Dois motivos me levavam ao castelo: a sua beleza arquitetónica e perfeito enquadramento na propriedade deslumbrante e a exposição que estava patente no seu interior!

Não é todos os dias que se podem ver obras de Niki de Saint Phalle (falecida em 2002) ao vivo! A pintora/escultora das bonecas gordinhas e coloridas!

Ou obras de Arman, (falecido em 2005), o pintor/escultor das “tralhas” e das desconstruções!

A conjugação do interior antigo com as obras modernas fazia um efeito curioso e agradável! Perdi-me ali dentro!

Depois vieram os lagos de novo e os enquadramentos que o castelo permite no seu ambiente envolvente.

E despedi-me do belo castelo pois tinha tantas coisas fantásticas para ver ainda naquele dia!

(continua)

72 – Passeando até à Suíça 2012 – A França – Château de Chambord, Blois, Amboise, Tours…

3 de Setembro de 2012 – continuação

De cada vez que passei em Chambord prometi a mim mesma que teria de visitar o palácio/castelo por dentro e nunca o fiz! Desta vez, que nem pensara em lá passar e me desviei à última hora, não resisti! “Que se lixe a distância, se chegar a meio da noite para dormir, alguém me há-de abrir a porta!”

Uma das coisas que me chamava a atenção era a famosa escada em dupla espiral e ela está logo ali, é o coração do edifício!

Dizem que o edifício foi concebido segundo um esboço de Leonardo da Vinci e que a Grande Escada, em dupla espiral, foi mesmo um projeto seu! Esta escada fantástica tem a particularidade de entrelaçar duas espirais, o que faz com que quem sobe numa não cruza com quem desce noutra!

No meio, uma coluna de vazio se forma até à claraboia superior, provocando uma perspetiva alucinante com aberturas de corrimão até ao topo!

O castelo de Chambord é do séc. XVI e nunca foi completamente concluído, afinal ele era apenas uma residência de caça e para uns dias de caça quase 2000 pessoas acompanhavam o rei! Quanta privacidade!

Durante a ocupação nazi as obras do Louvre foram trazidas para lá, a fim de as salvar da pilhagem e destruição e entendemos a escolha quando nos aproximamos do palácio e nos apercebemos o quanto ele fica longe de tudo! Bem como quando percorremos os seus longos corredores, alas e salões, entendemos porque foi escolhido para proteger tão importantes obras!

Os telhados são repletos de elementos decorativos que se misturam com chaminés e respiros e criam perfis curiosos do edifício!

As escadas nos recantos dos pátios interiores, como “tourelles” são escadas em caracol deliciosas!

Há pormenores curiosos no palácio, os quartos de dormir são muito grandes, as camas parecem altares, cheios de cortinas em dossel, por vezes mesmo com grades que separam o espaço da cama do restante quarto e no entanto as camas são tão pequenas!!

Eu estive-me lá a medir e não caberia assim tão bem ali dentro! Para além de me sentir claustrofóbica!

E em cada andar a fantástica escadaria domina o cruzamento de salas e corredores!

Ao longe, pela janela vislumbra-se o fosso! Um fosso que foi construído, já de origem, para ser decorativo e serve ainda hoje a sua finalidade, pois é fantástico!

E as torrezinhas de escadinhas em caracol são lindas vistas de cima!

Lá de cima podem-se ver finalmente as clarabóias, as cúpulas, as chaminés e os telhados escamosos, em pormenor e a perspetiva é fascinante!

Toda aquela “tralha” que se vê de longe em cima do edifício fica ali ao nosso lado!

O jardim não tem fim…

Chega-se lá acima ao telhado, pela fantástica escada em duplo caracol, que termina numa torre oca, decorada e impressionante!

E, claro, depois de ter espreitado de baixo para cima, tive de espreitar de cima para baixo, pelo vão cilíndrico que se forma no centro das escadas espiraladas!

Momentos em que, quem desce numa escada, cruza olhares com quem sobe na outra!

magnificas escadarias…

E à medida que me afastava do castelo, para ir buscar a minha motita e seguir viagem, não consegui afastar os olhos dele, nem deixar de fotografa-lo…

E Chambord despediu-se de mim na minha própria língua, com um “Obrigado”!

Segui nostálgica o meu caminho. Porque tinha o tempo de estar cinzento? Para me entristecer mais ainda o regresso?

Blois veio logo a seguir, depois da Reserve National de Chasse de Chambord, uma cidade bonita e acolhedora que me proporcionou enquadramentos muito bonitos, com o famoso Loire a completar o quadro!

Foi uma pena passear por Blois com o céu cinzento!

Encontrei a igreja de Saint-Nicolas, uma construção tão monumental quanto bela!

Uma daquelas belas igrejas românicas que me faz parar imediatamente, saltar da moto e ir ver!

E lá dentro a atmosfera é tão pura quanto a arquitetura que a cria!

O núcleo histórico da cidade é muito bonito e bem conservado, sem monstruosidades arquitetónicas a perturbar a sua beleza!

Ruelas como nesgas, entre casas, improprias para claustrofóbicos, não faltam por lá!

No seguimento do meu percurso passei em Amboise, porque ficava na margem do meu caminho! E de novo não fui visitar o seu castelo! Voltei a fazer uma foto com a moto no mesmo lugar como fizera em 2009, quando lá passei a ultima vez, com o Rio Loire como paisagem e o château d’Amboise ao fundo!

Ainda não foi desta que o fui visitar por dentro, ficará para uma próxima vez!

E ao chegar a Tours, numa curva do caminho, uma moto me saltou à vista! Parei de repente mais à frente e voltei para confirmar que não me enganara: era mesmo uma X11, uma linda motita igual à do meu moçoilo!

Naquele dia publiquei a imagem no meu mural do facebook, para que ele a visse!

E lá estava a catedral de Tours! Linda e imponente construção gótica que demorou 4 séculos a ser concluída, entre o séc. XII e o XVI.

Esta era uma das catedrais que queria muito ver e foi por ela que ali fui, embora a cidade também me despertasse o interesse.

Afinal eu só visitei 32 das 51 mais belas catedrais de França, ainda me falta visitar tantas! 😉

Aqueles tetos “suspensos sobre pedacinhos de vidro chumbado”, que são os vitrais, fascinam-me! Como uma luta entre o terrestre e o divino, entre o peso e a gravidade!

E estava na hora de ir embora! O sol não queria nada comigo e eu queria ir dormir muito longe dali! Dei uma última olhada a Tours e segui sem parar nem pensar muito até Tulle, em mais de 300 quilómetros de paisagens tão lindas quanto tristes, pela despedida e pela falta de sol…

Cheguei à “minha casa” daquela noite, tarde. Uma maison d’hotes linda e com um anfitrião muito simpático que me ofereceu um lanchinho bem-vindo e dois dedos de conversa, que eu já vinha calada há muitas horas!

O meu quarto, como toda a casa, parecia um quartinho de bonecas, quente e aconchegado, que por aqueles dias as noites já eram frias!

E foi o fim do trigésimo sexto dia de viagem…

71 – Passeando até à Suíça 2012 – A França – Meung-sur-Loire, Chambord

3 de Setembro de 2012

As coisas precipitam-se sempre um pouco na minha cabeça quando uma viagem se está a aproximar do fim. De repente a sensação de que não vi muita coisa que queria e a sensação de que passará muito tempo até eu poder voltar a partir, começam a interferir no meu ânimo! Tinha recebido um mail da escola comunicando uma reunião e eu teria por isso de chegar a casa a tempo! Isso entristeceu-me um pouco pois era sempre menos um dia na minha epopeia…

Então fiz-me à estrada querendo ver tudo o que me aparecesse no caminho, à medida que descia o país na direção de Tulle.

Claro que fui parando nas terrinhas que me apareciam e, a dada altura, tive de parar com isso e correr para não chegar a meio da noite ao meu destino! Nada disso aconteceria se eu não tivesse de repente de estar em casa no dia 8…

Meung-sur-Loire chamou-me atenção ao longe e fui ver como era. É comum os Franceses acrescentarem ao nome das cidades um “sur” e o rio que lhe está próximo e ali continuava a ser o rio Loire!

A cidadezinha é deliciosa! Medieval e com uma igreja espantosa, a Collégiale Saint-Liphard do séc XII, com boa parte românica e a sua torre fortificada que parece a torre de um castelo!

Encostadinho à igreja fica o castelo, quase se confundindo com ela, aliás as suas partes mais antigas serão mesmo contemporâneas da collégiale!…

O castelo é lindo e deu-me imensa pena não poder visitar, pois estava fechado! Por azar o horário muda em Setembro, quando começa a abrir só de tarde…

Um castelo cheio de história, que participou na história da França, entre outras personalidades Joana D’Arc passou lá!

Soube que é muito bonito e que vale a pena visitar, mas teria de ficar para outra altura!

Dei uma volta pela cidade, que é encantadora!

E lá estava a estátua da Joaninha! Afinal ela libertou a cidade por isso é venerada por ela! Chamam-lhe a Libertadora!

A torre imponente do antigo Hôtel Dieu do séc. XII. Curioso chamarem Hotel de Deus aos hospitais ou hospícios!

E mais uma igreja impressionante, a Abbatiale de Notre Dame, do séc. XI, que conservou elementos românicos espantosos, apesar das remodelações posteriores!

Aquele altar apaixonou-me! Quando temos o hábito de ter os batistérios aos “pés” das igrejas, ali a pia batismal está bem no topo da igreja, e o efeito é lindo!

Foi uma agradável descoberta Meung, serena e antiga como eu tanto gosto!

Há coisas feias que se encontram no meio do paraíso… que acabam por se tornar lindas no contexto!

E de repente não resisti, desviei-me do meu caminho e fui atras das placas…

Eu já fizera aquele caminho e já sabia que a estradinha é longa e cheia de avisos, pois há animais à solta por ali, é preciso ter cuidado com as velocidades! Já uma vez na Eslovénia quase chocava com um alce que atravessou a estrada de um salto e deu para perceber que, ou se vai devagar… ou é a morte do artista!

E pude comprovar que em França sabem que existem portugueses, e escrevem, entre outras línguas, na nossa língua, porque somos gente! Coisa que não acontece em Espanha, por exemplo, um país que fica tão longe do nosso que tem folhetos, placas e indicações em francês, inglês, alemão ou italiano, mas raramente em português!

E lá estava ele, o Château de Chambord, um dos maiores castelos do Vale do Loire!

Eu visitara os seus exteriores a pé, da última vez que ali estivera, por isso fui pelos caminhos que sabia onde a moto podia passar. Não me apanham a caminhar duas vezes por uma extensão tão grande se descobri caminho para a minha motita para lá! Claro que depois pusemo-nos a tirar fotos uma à outra com o castelo como paisagem, como fazem os turistas todos!

Mas desta vez fui visita-lo por dentro…

(continua)