17. Passeando pela Grécia/Balcãs – a bela Dervish House…

4 de setembro de 2022

Viajar com dor era tão desafiador e incapacitante que era admirável, até para mim, como eu conseguia encontrar formas de lidar com a situação. Felizmente eu consigo dormir com dor, fazendo uso da minha capacidade de superação e adaptabilidade, senão teriam sido dias de sofrimento e noites de insónia!

Lembro-me de sonhar que me estavam a esmagar o braço de formas sempre aterrorizantes, a cada noite com instrumentos diferentes, como em filmes de terror sucessivos!

A vantagem é que, ao acordar tudo parecia muito melhor, menos assustador e menos doloroso do que nos sonhos, e eu via-me cheia de alegria porque apesar de tudo o sofrimento real era menor e menos assustador que o sonhado!

Uma boa forma de encarar cada novo dia!

De manhã não estava calor nenhum.

Felizmente a minha casinha era quentinha e confortável, mas a gente abre a porta do quarto e está no quintal e isso é estranho! É quase como dormir numa tenda, só que com mais conforto e sem ter trabalho a montar a casa ou de gatinhar para a cama!

O parque de campismo está situado num sitio deslumbrante, na borda do Canyon Tara e está preparado para receber gente que quer aproveitar o rio Tara e toda uma série de desportos radicais aquáticos.

Na realidade o Camp Kljajevića Luka disponibiliza uma série de atividades aquáticas de aventura, como fazer rafting ou navegar de caiaque pelos rápidos do rio Tara.

Qualquer atividade radical estava fora do meu alcance, mesmo que eu tenha pensado inicialmente na hipótese de experimentar alguma.

Mas a reformulação dos planos inicias da viagem fez com que eu apenas pudesse ficar ali por uma noite pois, além de não ter tanto tempo como desejaria, eu já sabia que não iria ter condições físicas para me aventurar…

Uma pena… pode ser que eu volte a passar por lá um dia.

No momento só me podia permitir passear em redor e apreciar os encantos do lugar.

Para mim a grande vantagem do parque, que eu podia aproveitar à vontade, era o simpático restaurante. No dia anterior fiquei lá até às tantas a comer e a beber e hoje iria lá tomar um belo pequeno almoço.

Depois de toda a chuva que eu apanhara, durante todo o dia de ontem o meu telemóvel não se deixava carregar, soltando um apito forte cada vez que o tentava ligar a uma tomada ou à power-banc. Nunca me tinha acontecido tal, até porque dizem que ele é à prova de água! Mas ele continuava a dizer que tinha humidade no sistema, pedia para o secassem com um secador (eu nem sabia que ele sabia escrever a pedir tal coisa!) e gritava!

Por isso passei o dia todo usando a bateria restante até ao limite. Cheguei ao parque muito preocupada pois, se não conseguisse carrega-lo, não teria bateria para continuar a fotografar hoje!

Por entre gestos e sinais pedi à menina do restaurante que me arranjasse algo para o secar, ela não falava inglês e não entendia por muito que me explicasse. Então liguei-o à corrente e, assim que ouviu o apito desesperado do telemóvel, ela pareceu entender, embora não conseguisse ler a mensagem que ele mostrava no visor. Voltou-me as costas e foi para a cozinha… Fiquei à espera a ver o que ela iria trazer-me, na cozinha seguramente não havia um secador de cabelo!

Então ela apareceu com um prato fundo cheio de arroz e enfiou o meu telemóvel lá dentro! Extraordinário, há coisas que são mesmo universais, heim?

Não demorou nem uma hora e ele deixou-se ligar à corrente em silêncio!

Então foi como se se tivesse criado uma conexão entre a miúda e eu e a partir dali foi um serão fantástico, com jantar caprichado e oferta de licores da região e tudo!

E pronto, já que não podia fazer atividades físicas exigentes, podia, pelo menos, encher-me de comida em paz!

E por falar em encher-me de comida, era mesmo isso que eu estava a precisar pois já parecera que perdera alguns quilos…

Oh, e que bem sabia o gelo no meu pulso!

Era como se ele estivesse sempre febril e o gelo o acalmasse. Pessoas olhavam como curiosidade para o meuconjunto azul, não havia forma de esconder o que estava a fazer, por isso pousei tudo em cima da mesa.

“Bom dia mundo! Não gosto que me vejam comer ao pequeno almoço, a minha mão está tão presa que nem consigo pegar direito no garfo! As pessoas ficam atónitas, como vou seguir conduzindo a minha moto com uma mão que não funciona direito? Sem problema, ao longo da manhã ela vai acordando para a vida, até ficar quase como nova” in Facebook

De repente ouviram-se berros lá dentro, um homem ralhava com alguém, depois varias vozes ralharam também! Não podia entender o que diziam, mas era claro que estavam a enxotar um miúdo, pensei eu.

Mas quem saiu não foi um miúdo humano, foi um bichinho! A principio pensei que era um cão, mas ao olhar melhor deu para perceber que não! O pobre pequeno, meio desamparado, veio encostar-se a mim. Mas quem correu com ele veio tira-lo de mim.

Só então puder ver melhor que carinha tinha.  Seria da família das cabras? Dos cervos? Veados? O que és tu fofinho?

O bichinho estava tão desamparado que apeteceu-me pegar-lhe ao colo!

Vendo-me olhar para ele com pena os homens explicaram que ele era um chato, que fuçava em todos os cantos, se metia debaixo das pernas das pessoas e, se não o impedissem, ia tentar meter-se dentro dos armários ou da despensa!

Tirei-lhe uma foto para pesquisar no Google Lens e descobri que era um Rupicapra bebé, também conhecido como camurça.

Dizem que são animais adoráveis, de pelagem macia, muito ágeis nas montanhas e com uma natureza brincalhona. Podem ser encontrados nas altas montanhas, desde os Pirinéus e Alpes até aos Balcãs.

Foi preciso ir tão longe para eu o ver, já que eles não se deixam observar facilmente de perto na vida selvagem. E ali estava um, que tinha de ser enxotado para não se meter no meio das pernas das pessoas, nem entrar pelas casas dentro!

Tão fofinho!

E pronto, estava na hora de me pôr a andar.

As paisagens em redor do parque de campismo mereciam algumas pausas, fotos e desenhos, o tempo necessário para ginasticar a minha mão até ela recuperar um pouco mais de mobilidade, para eu poder aproveitar depois as estradas cheias de curvas que viriam a seguir.

Junto à ponte, no início da rua do parque, há uma placa muito simpática!

E, do meio da ponte, pode-se ver o parque ao longe, numa clareira na borda do precipício do Canyon. Àquela distancia parece tão pequeno que o assinalei com uma setinha vermelha.  😀

Que sitio privilegiado para se montar um parque de campismo! Seguramente que um dia irei voltar a hospedar-me ali!

A ponte é como uma varanda sobre o paraíso!

A Ponte Đurđevića Tara é um marco importante na história do país e da ex-Jugoslávia e esse foi um dos motivos que me fez reservar dormida junto a ela.

Foi erguida entre 1937 e 1940, em tempos do Reino da Iugoslávia e supervisionada por Belgrado. Atravessa Canyon Tara e fica 172 metros acima do rio. Quando foi concluída tornou-se a maior ponte rodoviária em cimento da Europa.

Estava-se em plena II Guerra Mundial e, com a invasão liderada pelos alemães em 1941, grande parte de Montenegro, incluindo o Canyon Tara, foi ocupada pelos italianos. O terreno montanhoso da zona favoreceu a guerra de guerrilha e, durante uma ofensiva italiana, os jugoslavos destruíram de forma cirúrgica um dos arcos próximos à margem, com o auxílio do engenheiro da ponte, Lazar Jaukovic, inutilizando a única passagem sobre o Canyon para impedir o avanço italiano. No entanto os italianos acabaram por tomar conta de tudo e, quando capturaram o engenheiro, executaram-no em cima da ponte…

Provavelmente um dia alguém contará esta história com um “Reza a lenda…” pois a verdade é que a história está ligada à ponte, como as lendas estão ligadas a castelos, mosteiros e aldeias…

A ponte acabou por ser reconstruída em 1946.

Mas como eu não sou arquiteta nem engenheira, para além da ponte, foi a paisagem me trouxe aqui!

O rio Tara e as montanhas em redor são tão extraordinários, que todo o tempo que passei a contemplar e a espreitar, foi pouco. Quando inicialmente decidi pernoitar junto ao Canyon, eu tinha em mente ir lá abaixo de moto, por um caminho que leva a uma igreja, e de lá poderia apreciar a ponte ao longe e tal…

Mas na hora de descer não tive coragem… ainda desci um pouco, mas o caminho era longo, íngreme e em terra batida…

A minha mão, meio inutilizada, e o trauma da queda que quebrara meu pulso, não me permitiram arriscar… 

Quanto tempo iria demorar até o trauma passar?

Eu sou de choramingar pelo perdi e sim de aproveitar ao máximo o que tenho, por isso segui curtindo tudo o que podia, porque as estradas eram inspiradoras e cheias de curvas.

Montenegro é um país deslumbrante com estradas cénicas, montanhas imponentes e vales verdes, sempre com rios cristalinos a passar-lhes pelo meio. São paisagens que me enchem as medidas e facilmente prendem por completo a minha atenção. Desde a primeira vez que explorei este pequeno recanto dos Balcãs que me encantei e sempre que volto me encanto de novo!

As paisagens deslumbrantes, a rica cultura e a hospitalidade calorosa dos montenegrinos tornam cada visita uma experiência única e memorável. É como se, a cada regresso, eu reencontrasse um pouco de mim que deixei para trás quando cá passei de outras vezes!

Então passei por um grupo de motociclistas que me cumprimentaram vivamente, mas, mais à frente, quando parei para tomar um café e eles chegaram, não reagiram! Pousaram as motos e ficaram no seu canto. Muitas vezes me acontece isso e não sei porquê! Como se não se sentissem mais confortáveis em falar-me como quando me cumprimentam de moto para moto! Será que se sentem incomodados junto de mim? Será que intimido outros motards?

Aproveitei o café e continuei desfrutando a minha pausa, com aqueles homens a olhar para mim de longe!

Não faz mal, se ninguém me liga eu também não ligo a minguem e pronto!

Havia tanta paisagem fantástica para ver que isso nem era um problema, muito menos algo importante que me preocupasse. Até porque quando a beleza é realmente grande, o silêncio é a melhor companhia!

E lá estava o Slano jezero, lindo!

Nos arredores de Nikšić, há três lagos artificiais, incluindo o Lago Slano (Slano jezero), criado para suprir as necessidades da central hidroelétrica de Perućica. Nem parece uma estrutura artificial, com uma barragem em uma das extremidades! O lago é encantador, com uma beleza selvagem e natureza intocada ao redor. As águas são azuis cintilantes com varias ilhas e ilhotas pelo meio e margens verdes, que tornam o panorama quase irreal!

Há um miradouro, com um bar bem rustico, de onde se pode ver todo aquele panorama deslumbrante!

Claro que voltei a parar, mas não me atrevi a tomar mais um café, pois embora ele não pareça nada de especial, seguramente a cafeína me iria fazer querer correr mais do que a moto!

“Passei mais uma fronteira e foi uma experiência inédita! O polícia que conferiu meus documentos fez-me uma festa por ser uma Lady sozinha e, quando segui caminho, um motociclista croata colou-se a mim! Eu acelerei e ele também, eu reduzi e ele também. Até que parei para ver um mosteiro, ele parou também! Disse-me que era muito fixe viajar comigo, queria continuar. Nem penses homem, eu vim sozinha e quero continuar sozinha. Estava complicado descarta-lo! Então meti-me pelos quelhos da cidade e deixei-o para trás. Nunca me tinha acontecido algo assim! 😮” in Facebook

A seguir à fronteira estava a atravessar as montanhas de Klobuk, na Bósnia e Herzegovina.

Eu sabia que havia ali para baixo as ruinas de uma fortaleza medieval, mas não podia querer ver tudo.

Essa é uma experiência que levo comigo em cada viagem, nunca tentar ver tudo para não perder o prazer de viajar, por entre a ansiedade de correr de lado para lado.

Então limito-me a fazer o que é possível sem lamentar o que não é!

Sem sair da minha estrada, o que se via era bonito o suficiente para eu seguir feliz o meu caminho, sem sacrificar demais a minha mão marota!

E cheguei a Trebinje.

Eu já tinha passado perto, vinda de Dubrovnik a caminho de Sarajevo, mas não cheguei a explorar a cidade, apenas olhei de longe e pensei que um dia lá passaria.

E esse dia era hoje!

Trebinje é a cidade mais ao sul da Bósnia e Herzegovina, muito perto do mar Adriático e de Dubrovnik.

Na realidade, a Bósnia, apesar de ter uma extensa área próxima ao mar, possui apenas um pequeno trecho de costa. Assim, é sempre interessante seguir ao longo da costa croata, atravessar uma fronteira, percorrer apenas 21 quilômetros na Bósnia e depois cruzar outra fronteira para retornar à Croácia!

Trebinje é atravessada pelo rio Trebišnjica, que já se chamou Arion.

O rio é um fenómeno único, com muitos trajetos à superfície e subterrâneos. Corre para o Mar Adriático pelo subsolo e reaparece muitas vezes à superfície. Com uma extensão de quase 190 km, metade dele corre por baixo de terra o que o torna o rio mais longo do mundo a fazer esta habilidade.

E é em Trebinje que ele é mais bonito e corre à superfície dando umas voltas e curvas.

Resumindo, eu estava junto a uma verdadeira celebridade!

Fiz um picnic, ali ao lado, junto ao monumento a Luka Vukalovic, o herói nacional que defendeu a Herzegovina liderando os rebeldes que lutavam contra a opressão e infligiu pesadas derrotas aos otomanos em várias batalhas.

Ao andar por aqueles países tem-se mais noção de quanto lutaram todos contra o grande império Otomano!

Depois subi a colina Crkvina e as perspetivas sobre a cidade eram cada vez mais esplendidas!

No topo fica o complexo templo Hercegovačka Gračanica, dedicado à “Anunciação e Bem-Aventurada Virgem Maria”, o destino religioso mais visitado da Herzegovina Oriental.

Foi construído em 2000 para homenagear o desejo do famoso poeta Sérvio Jovan Dučić, que deixou declarado no seu testamento que queria ser enterrado nas colinas que rodeiam Trebinje.

Curioso como a história da zona se mistura com a da Sérvia e de Montenegro, afinal aquilo tudo era parte do Império Otomano, ou Turco, que durou uma infinidade de tempo, mais de 6 séculos, e só por isso a história daqueles povos mistura-se quando eram um povo só!

E eu que reparo sempre nos números não pude deixar de achar curiosa a semelhança dos anos de inicio e de fim do Império:  começou e, 1299 e terminou em 1922!!!

No complexo, além da igreja, existe a torre sineira, o palácio do bispo, um anfiteatro, uma loja de souvenirs e o restaurante com esplanada que se espalha pela enconsta abaixo em degarus.

E as vistas sobre a cidade são incríveis com a Ponte Otomanda de Arslanagić sobre o rio Trebišnjica, lá em baixo.

A ponte que foi movida, pedra por pedra nos anos 60, por vários quilómetros por causa da construção de uma barragem.

É fascinante ver de perto um pedaço de história de uma cidade e de uma região!

As coisas que a minha motita testemunhou!

Logo a seguir fica o Manastir Tvrdoš, dedicado à Dormição do Santíssimo Theotokos, um local de grande importância histórica e religiosa.

Foi fundado no século IV pelo imperador romano São Constantino e sua mãe Santa Helena. Tem por isso raízes muito antigas que remontam à época do Império Romano, com vestígios que podem ser vistos pelos fundamentos da antiga igreja romana, através do vidro que cobre parte do chão da igreja.

“Estava calor, eu tinha o blusão vestido e ainda tive de pôr uma saia para entrar na propriedade! Tive eu e todos os que quiseram visitar, até os homens que estavam de calções puseram a saia para tapar as pernas. Foi giro de ver! Mas o mosteiro valeu a pena, era lindo!” in facebook

Lá andávamos todos de saia azul, mulheres e homens!

As mulheres tinham de usar a saia mesmo estando de calças compridas como eu, os homens tinham de por a saia se estivessem de calções.

Eles não podem entrar mostrando as pernas, elas não podem sequer estar de calças. É sempre assim nos mosteiros ortodoxos, aconteceu-me o mesmo há anos para visitar s mosteiros de Meteora, na Grécia.

O mosteiro é composto, não apenas de espaços religiosos, mas também por diversos espaços de habitação de arquitetura muito curiosa.

O que aqueles mosteiros têm de fascinante é a beleza dos seus espaços, que me dão a sensação de que viver ali nunca seria monótono!

A igreja cinzenta da parte de fora, é um mundo de cor e historias no interior. Totalmente preenchida por afrescos, alguns ainda fragmentos de do sec. XVI

A riqueza do interior é hipnotizante, que se olha como para um livro de historias.  

As paredes adornadas com afrescos detalhados contam histórias de fé e tradição, enquanto as preciosas relíquias abrigadas falam muito sobre o passado histórico da igreja.

A relíquia mais importante do local é a mão de Santa Helena.

Para mim é sempre uma coisa estranha isto das relíquias! Parece-me tão inapropriado que alguém tenha mutilado o corpo da santa para lhe tirar um pedaço…

Varias capelinhas se sucedem numa subida ingreme, inspirando paz e reflexão necessária num local de paz e oração como um mosteiro. Um ambiente que contrasta com muitos dos mosteiros católicos mais austeros e monocromáticos!

E cada capelinha que se revela durante a subida é diferente e cheia de cor e história como se vivesse por si só!

Mesmo as mais pequenas têm o seu interior impressionantemente trabalhado como se fosse a mais importante do local!

Cada uma é um lugar onde o tempo parece suspenso, permitindo que os visitantes mergulhem em uma atmosfera de serenidade e contemplação.

O mosteiro foi destruído e reconstruído por diversas vezes ao longo da sua história e boa parte da construção atual é do séc. XVI.

E no topo da subida, feita de degraus e capelinhas, fica o cemitério todo torto, cheio de desníveis, mas muito bonito!

Sim, é sabido que eu aprecio visitar cemitérios!

Além dos monges terem um espaço variado e nada monótono para passarem os seus dias de oração e reclusão, também têm terrenos para tratar e cultivar. E cuidam da sua vinha e produzem mesmo o seu próprio vinho! E ao que me pareceu, um vinho muito apreciado!

Parece que lá, como cá, se produzem nos mosteiros coisas interessantes para beber e comer!

Ao sair do mosteiro, seguida de outros visitantes, cruzei com um par de noivos seguido do fotografo. Devem ter escolhido o mosteiro para fazer algumas fotos e foi bem escolhido, com os seus recantos bonitos e nós, os visitantes, todos de longas saias azuis, faríamos uma boa pandilha de damas de honra!

Não? Não querem? Uma pena, eu não me recusaria a participar das fotos se me levassem para a boda também!

Segui em passo de passeio por paisagens encantadoras.

Eu queria ir a Blagaj há muito tempo e ia aproveitar que ainda era cedo para tentar lá chegar. Digo “tentar” porque, se os caminhos fossem uma bosta e não me sentisse confortável a conduzir por eles, seguramente desistiria.

Eu sei! Eu, que nunca me recusei a ir a algum sitio, nem que tivesse de meter a minhas rodas por cascalho, gravilha ou lama, que subi penhascos e desci barrancos, com motas inapropriadas de mais de 300kg, agora seguia já pensando em desistir se as ruas fossem apenas manhosas…

Mas é assim, faz-se o que se pode com o que se tem, sem remorsos…

Para chegar a Blagaj passei por caminhos que mais pareciam propriedades privadas, atravessei campos e localidades que nem chegavam a ser aldeias. Então lá estava o rio Buna, que é a origem do rio Neretva que atravessa a cidade de Mostar, não muito longe dali.

Não havia indicações do que eu procurava, por isso fui seguindo por ruas pavimentadas de pedras meio irregulares, guiando-me pelo curso do rio.

Quando achava que seria bom parar a moto, um homem saiu do seu jardim para me dizer que não parasse ali, que seguisse mais para a frente pois ainda estava longe e haveria lugar para a minha moto mais perto.

A mim parecia-me que já estava perto o suficiente, podia ver o grande muro formado pelo rochedo, que parecia tão perto! Mas lá segui as instruções do senhor, agradecendo a atenção.

E claro, ele tinha razão!

A rua empedrada ia dar a um caminho pedonal em cimento, que mais parecia o quintal de alguém. Dali para a frente não se circulava mais. Dois homens me chamaram para eu estacionar a moto num terreno de terra batida ali ao lado, com cabine para pagamento do parque e tudo.

Oh senhores, eu não tenho dinheiro bósnio! E agora?

Já me estava a imaginar ter de ir pôr a moto no fim do mundo e depois caminhar até la de novo…

Mas os homens mandaram-me pôr a moto ali mesmo, arrumando as cadeiras de plástico e a mesa de campismo no canto junto à cabine.

Ok, tudo bem, vou levantar dinheiro assim que possa para lhes pagar.

O ambiente surpreendeu-me, de alguma forma eu esperava que fosse um sitio cheio de turistas, mas sem nada mais do que a montanha, o rio e o tekke histórico!

Felizmente os turistas eram poucos, o que me surpreendeu!

Isto de estar a viajar já fora da época alta, tem as suas vantagens. Se eu pudesse sempre o faria ou em junho ou em setembro!

Também me surpreendeu a quantidade de restaurantes na margem direita do rio, com passagens e pontes entre eles, e as águas do rio a passarem em seu redor!

Fantástico, aquilo tudo era tão bonito e inspirador que decidi que iria jantar ali, sem nem me importar se depois seguiria viagem já de noite.

Então, depois de passar os restaurantes e seguir por um caminho invisível na encosta da margem, por trás das casas, lá estava o tekke e a nascente do rio.

O tekke histórico é um mosteiro do séc. XVI, uma construção lindíssima que combina elementos da arquitetura otomana com um estilo mediterrâneo.

O sitio por si só já é bonito, com a agua turquesa muito transparente do rio e o penhasco acima, mas as construções ainda o tornam mais surreal!

Claro que me sentei ali a olhar em redor e a desenhar.

Às vezes os turistas não são muitos, mas há os suficientes para perturbar completamente o paraíso…

Uma fulana, vestindo roupas chamativas amarelo vivo, e usando um pau de selfie com o imenso telemóvel na ponta, apareceu. E ela, sozinha, conseguia arruinar o momento, falando muito alto para o telemóvel, que devia estar a gravar as parvoíces que dizia. Nem sequer estava a falar do local ou algo relacionado a ele, apenas falava de si e de como era fantástico viajar. Certamente tretas de lives para o Insta.

Continuei a desenhar em silêncio, para não perturbar a sua algazarra. Estão aquela estupida dirigiu-se mim, mandando-me sair dali para que ela pudesse ficar sozinha a filmar!

A sério?

Oh rapariga, aproveita o que tens e em silêncio para não perturbares a minha paz, dá-te por feliz por eu nem estar na frente de paisagem nenhuma e cuida de não me captares na bosta da tua live, ou poderás ter problemas legais comigo, ok?

A mulher ficou visivelmente em choque, até esperei que me viesse com um “sabe com quem está a falar?” como acontece nos filmes, mas não, ela simplesmente afastou-se para a ponta do espaço e ouvi-a a a falar com um tom muito mais baixo para a filmagem.

Acho que o meu aspeto intimida mesmo as pessoas!

Respeitinho é bom e eu gosto!

O mosteiro Dervixe tem um grande significado como marco espiritual e histórico. A sua construção ocorreu no contexto do misticismo islâmico, com os Dervixes desempenhando um papel crucial na orientação dos indivíduos para uma compreensão mais profunda da espiritualidade através das suas práticas, dado que o mosteiro era um local de adoração e meditação comunitária.

Na realidade a sua filosofia é de pura espiritualidade, vivendo em condições de grande pobreza e austeridade.

Já agora os dervixes mais famosos são os Dervixes Rodopiantes da Turquia, que rodam sobre si por horas, com saias brancas a fazer balão.

Para minha tristeza, não há multibancos por ali, nem existe a possibilidade de fazer pagamentos com cartão nos restaurantes… ainda pensei em negociar para pagar com euros, mas decidi que não valia a pena, o melhor era seguir para Čalići e jantar por lá.

Mas agora, como iria pagar aos homens o estacionamento? Catei a carteira à procura de moedas de euro, que são sempre aceites. Mas eles não quiseram o meu dinheiro, fizeram-me uma festa de despedida com acenos e lá segui o meu caminho.

Mais tarde percebi que o pagamento do estacionamento era de 2€, foi quanto eles deixaram de receber e ainda me fizeram uma festa!

Não estava longe do meu destino para aquele dia, mas ainda subi o desfiladeiro de Žitomislići.

Às vezes tenho pena que meio nenhum consiga captar o que os meus olhos veem! Eu sei que existem muitas possibilidades, mas nunca me entusiasmei porque ficam sempre aquém do que eu vejo. E nunca me apetece perder tempo montando gadgets por isso também não o faria com outros mais sofisticados que comprasse!

A subida do monte e a perspetiva lá de cima, sobre Žitomislići e o rio Neretva era deslumbrante! Merecia umas perspetivas de drone…

Cheguei a Čalići.

Estava instalada num centro pastoral na cidade das famosas aparições bósnias. Um rapaz muita simpático veio arrumar a esplanada para que eu pusesse a moto lá dentro, protegida do temporal que ele dizia estar a aproximar-se.

A residência estava cheia de peregrinos vindos de todos os pontos do planeta. Estaria a ser servido um jantar para todos, se eu quisesse poderia jantar também.

Excelente, vamos lá jantar em grupo.

O temporal chegou com chuvas e ventos fortes, mas podiam ouvir-se grupos passarem lá fora rezando alto. A fé não se deixa intimidar por temporais.

Amanhã vou explorar a cidade e visitar o Svetište Kraljice Mira o Santuário de Nossa Senhora Rainha da Paz.

16. Passeando pela Grécia/Balcãs – os Mosteiros de Studenica e de Žiča no meu caminho…

3 de setembro de 2022

Com chuva ou sem chuva, hoje seria o dia dos Mosteiros!

Igrejas, catedrais e mosteiros sempre me despertam o interesse. Não que eu seja particularmente religiosa, mas porque estes são sempre sítios cheios de historia que, frequentemente, permitiram que tesouros culturais chegassem até aos nossos dias, enquanto os que estiveram nas mãos de pessoas comuns foram desaparecendo ao longo dos séculos.

Quando dizem que a Igreja devia vender e distribuir todas as suas riquezas pelos pobres, não se pensa que, se realmente se fizesse isso pelo mundo fora, uma enorme parte do valor histórico da humanidade se perderia para sempre e os pobres continuariam a ser os mesmos!

Regimes políticos que o fizeram nos seus países, fizeram com que muito do seu património histórico religioso se perdesse, mudando dos locais religiosos onde esteve durante séculos e podia ser visto por todos, para as mãos de meia dúzia de pessoas poderosas, desaparecendo para o publico e, muitas vezes, para a humanidade. E os seus pobres não enriqueceram nada com isso!

O meu pequeno almoço foi fantástico, na esplanada de frente para a minha motita. Ah, e o pão ainda morno, aparentemente feito no local, era delicioso! Uma das coisas que gosto de conhecer em cada país que visito é o seu pão.

Vários camionistas vieram dos seus camiões tomar o pequeno almoço junto de mim. Vinham de vários países de leste, Roménia, Ucrânia, Bulgária, e aquele era um ponto estratégico onde paravam regularmente. Dormiam nos camiões e faziam as refeições da noite e da manhã ali.

Ficaram curiosos por eu andar sozinha por aquelas terras. Expliquei que já tinha andado nas terras de onde eles vinham noutras viagens. Mas o espanto foi quando repararam na minha mão esquerda, que eu tentava esconder debaixo da mesa, com a bolsa de gel enrolada.

Vários vieram ver de perto o que se passava. E, de repente, criou-se ali uma onde de solidariedade, em que me queriam levar, a mim e à minha moto, num camião para eu não sofrer a conduzir!

Demorei a entender direito o que se passava. Mas depois entendi, eles pensavam que eu tinha tido um acidente por ali, uns dias antes, e por isso queriam ajudar-me a chegar a casa, penando que eu não tinha condições de seguir conduzindo.

Ah, não se preocupem comigo! Eu tive o acidente há 2 meses, fui operada e assim que a mão mexeu parti de viagem! Por isso já ando na estrada há 15 dias, sem problema!

E preparei-me para partir sob o seu olhar incrédulo!

Ha coisas que me prendem a atenção nos meus caminhos…

Cemitérios sempre me chamam a atenção, porque revelam muito sobre como cada povo honra os seus entes queridos, mesmo depois da morte. O seu significado transcende o tempo e as fronteiras culturais, tornando-os parte integrante das sociedades em todo o mundo.

Há que veja os cemitérios como locais sagrados que exigem o máximo respeito, há quem tenha medo, se afaste e nem queira dar uma olhada, e há quem tenha as atitudes mais diversas com base em crenças religiosas ou costumes históricos. Eu gosto de os observar em cada pais onde passo, frequentemente paro e fico a olhar, por vezes fotografo a té desenho, como quem aprecia um jardim…

A seguir eu iria atravessar Dolina Kraljeva – o Vale dos Reis.

Sim, embora o nome nos leve imediatamente para o Egito, também há um Vale dos Reis na Sérvia!

Na realidade o Vale dos Reis ocupa um lugar significativo na história da Sérvia como o berço do país. Este vale desempenhou um papel crucial na formação da identidade e do desenvolvimento da Sérvia ao longo dos séculos. O seu significado histórico pode ser visto através de monumentos, eventos e figuras importantes associadas à região, que tiveram um grande impacto no país e deixaram um legado que chegou até hoje.

E cheguei ao  Манастир Студеница – Mosteiro de Studenica

Não havia parque de estacionamento “tradicional”, quero dizer pavimentado,
perto da porta e um monge me disse para estacionar no relvado! Confesso
que a minha motita ficou tão bem em contraste com o verde em redor!

Igrejas, mosteiros e templos definitivamente ajudam a compreender melhor a história da Sérvia porque preservam a história do patrimônio do país. Os templos mais bonitos e antigos foram construídos por governantes poderosos, alguns dos quais passaram seus últimos anos de vida como monges.

Na Sérvia, há 212 mosteiros, dos quais 54 são declarados monumentos de interesse nacional e este está na Lista do Património Cultural da UNESCO. 

Isso quer dizer que ainda tenho de voltar à Sérvia uma série de vezes para poder ver mais alguns!

O Mosteiro de Studenica, do final do século XII, é um dos maiores e mais ricos mosteiros ortodoxos sérvios e foi fundado por Stefan Nemanja o primeiro rei da Sérvia, nomeado pelo Papa e reconhecido internacionalmente.

Foi construído em um estilo arquitetónico específico, conhecido como “escola Raška”, que combina a influência do românico ocidental com a tradição bizantina oriental.

Não pude deixar de sorrir, ainda ontem me diziam que eu parecia uma cavaleira Raška!  😀

Lá estava o monje!

Os monges geralmente vivem em mosteiros, onde se dedicam à vida monástica de contemplação e oração. Diferentemente de pastores, professores, enfermeiros ou assistentes sociais, sua vocação é considerada única e distinta, não participando normalmente do ministério ativo da Igreja.

Dentro de um mosteiro, a vocação monástica é vista como uma vocação leiga, com apenas um ou dois padres responsáveis pela vida sacramental da comunidade, enquanto os demais membros se dedicam à busca espiritual e à vida comunitária.

Além das tradicionais funções religiosas, o mosteiro era um centro cultural e médico do Estado sérvio medieval, e o mausoléu da dinastia.

O recinto do mosteiro está cercado por muros fortificados e contem duas igrejas mais importantes, a Igreja de Santa Maria de Deus e a Igreja do Rei, e uma mais pequenita, a Igreja de São Nicolau.

Reza a lenda que o rei Stefan Nemanja, tendo perdido uma batalha com o exército bizantino, foi levado para Constantinopla (Istambul) como testemunha viva da vitória. Lá ele foi preso no mosteiro da Mãe de Deus. Rezando pela sua libertação, prometeu que, se ela o libertasse do cativeiro, ele construiria o mais belo mosteiro para ela. 

Quando foi libertado, ele cumpriu a sua promessa e o templo principal do complexo do Mosteiro de Studenica é dedicado à Mãe de Deus e foi construído como uma como igreja funerária para ele.

A Igreja da Virgem Maria é uma construção onde as influências do Oriente e do Ocidente se combinam de forma harmoniosa. 

As soluções espaciais baseavam-se nas soluções das fundações bizantinas, enquanto o desenho exterior e tratamento das fachadas, contam com elementos da arquitetura românica ocidental. 

O acabamento românico em mármore branco vê-se no exterior, a partir de meio da construção até ao altar. Uma conjugação curiosa de materiais que, a mim, me agrada pela conjugação das cores dos diversos materiais. Muito original!

O interior é, basicamente, todo em mármore.

A igreja estava em restauro o que não me permitiu apreciar direito o espaço.

Uma pena, pois eu sabia que lá dentro se encontra uma coleção inestimável ​​de pinturas bizantinas dos séculos XIII e XIV….

Mas ainda consegui ver o afresco mais bonito e famoso do lugar: “A Crucificação de Cristo”, uma das maiores realizações da arte medieval.

A Igreja do Rei parece uma joia, ou um grande relicário, mas que é pequena entre os edifícios mais altos em seu redor, o que realça ainda mais a sua beleza branca.

Foi muito engraçada a explicação do monge, pois chamava senhor ao rei e rei ao Senhor, o que era uma confusão para eu entender o que ele queria dizer!

Mas depois entendi!

A pequena igreja, dedicada a São Pedro, Joaquim e Ana, foi fundada por outro rei descendente de Nemanja, e acabou por ficar conhecida mais pelo seu fundador do que pelos seus patronos, sendo por isso chamada de Igreja do Rei.

Vinte minutos para entender isto!

A vida monástica sempre me intrigou! Tentei saber um pouco mais… e foi muito interessante!

Ali é marcada por uma rotina de oração, estudo, trabalho manual e reflexão, com ênfase na busca por Deus e na contemplação. Os monges buscam viver de forma simples, em comunidade, renunciando a bens materiais e ao mundo exterior, para se dedicarem inteiramente à sua fé e ao serviço a Deus.

Embora a sua atuação direta na sociedade seja limitada, a sua vida de oração é vista como um alicerce espiritual que sustenta a Igreja e o mundo, através de suas intercessões e testemunho de fé.

Não me pareceu muito diferente da ideia que tenho dos monges católicos.

O trabalho minucioso de restauro seguia também no exterior.

Às vezes as pessoas não têm muita noção do nível de minucia deste trabalho.

Lembro-me de um dia alguém me dizer que, se mandasse, não deixaria que restaurassem determinado local para não o estragarem! A pessoa não entendia que restaurar não é a mesma coisa que refazer, ou reconstruir! Claro que, frequentemente, há quem reconstrua um carro ou uma moto e chame a isso restaurar, mas restaurar é recuperar o que se puder da obra e prepara-la para resistir ao tempo sem continuar a degradar-se.

Isso quer dizer que, se faltarem partes, se pormenores tiverem desaparecido destruídos pelo tempo, eles não aparecerão com o restauro, não serão repintados nem acrescentados. Simples assim!

Ao sair do recinto do mosteiro, podia ver a pequena Igreja de São Nicolau, para mim uma capelinha!

O rei Nemanja decidiu que ele e seus descendentes teriam os seus túmulos em Studenica, por isso a igreja de São Nicolau certamente foi construída por um dos membros da família.  

Lá estava a minha motita, tão bem enquadrada no verde do grande jardim, no exterior das muralhas do mosteiro!

Era uma sensação curiosa perceber tão obviamente a aproximação do outono! Afinal eu nunca tinha viajado tão tarde e, em “tempos normais”, por aqueles dias eu estaria já em Portugal, não na Sérvia!

A seguir iria para o Манастир Жича – Mosteiro de Žiča

O que eu gosto do alfabeto e escrita sérvios! Imagino como seria escrever assim, como quem desenha bonequinhos!

O Mosteiro é do inicio do séc. XIII e foi local de coroação de 7 reis. O santuário permanece um símbolo com 800 anos de inspiração e fé para o povo e um local importante de peregrinação.

Foi fundado por dois irmãos, Stefan Nemanja, o primeiro Rei (o mesmo que , uns anos antes, fundou o Mosteiro de Studenica), e São Sava, o primeiro Chefe da Igreja Sérvia.

Os irmãos queriam criar um lugar sagrado para servir como um centro espiritual do país, naquela época, e um lugar sagrado para as coroações futuras.

Definitivamente aquela família era composta por gente muito importante, família de reis e santos!

Reza a lenda que uma porta secreta era aberta para cada rei, para que eles pudessem entrar no mosteiro quando quisessem e, supostamente, eram fechadas e seladas quando o governo do rei acabava.

Estas portas secretas seriam também utilizadas pelos reis como rotas de fuga em tempos de perigo. Dizia-se que conduziam a túneis subterrâneos que ligavam o mosteiro a locais distantes, acrescentando uma aura de mistério e aventura ao local. Embora não existam provas concretas da existência destas passagens secretas, a sua presença na tradição local adicionou uma camada de fascínio à história do mosteiro.

Os vestígios da lenda prevalecem no nome popular do mosteiro “O mosteiro dos sete portões” pelos 7 reis ali coroados.

Sendo uma importante relíquia da tradição sérvia e um local de inspiração e fé para pessoas em apuros, ou pessoas em busca de paz, o Mosteiro de Žiča foi muitas vezes alvo de banditismo e atrocidades dos inimigos.

No século XIV, com a opressão dos otomanos, a atividade religiosa do mosteiro de Zica foi reduzida e mantida em segredo e, com o passar do tempo, ele quase deixou de cumprir sua função como centro religioso.

As pessoas podem ter mudado o seu comportamento e mantido silêncio sobre suas crenças e esperanças sob o domínio otomano, mas quando chegou a hora de proclamar o Reino da Sérvia novamente e desfrutar da independência total, cinco séculos depois, um novo rei escolheu o Mosteiro de Zica como local de coroação.

As lutas do mosteiro continuaram, quando os alemães ocuparam a Sérvia em 1941, e ele foi incendiado, só sendo completamente restaurado quase uma década depois.

Os diversos espaços do mosteiro são muito bonitos, com capelinhas e igrejinhas espalhadas pela imensa área relvada. E aquilo que eu pensei ser uma fonte, na realidade era uma pia de agua benta lindíssima!

A Igreja da Santa Dormição, dedicada à Assunção de Maria, é o templo principal do mosteiro e desempenha um papel vital nas práticas de culto ortodoxo sérvio desde a fundação do local. 

Eu conhecia igreja revestida e pintada, por isso estranhei vê-la com a pedra original exposta, sem a característica cor vermelha que a tornava tão peculiar e que carateriza o próprio mosteiro!

A mudança na cor certamente despertou a minha curiosidade, no entanto não consegui encontrar quem me esclarecesse sobre a mudança. A cor vermelha, originalmente utilizada na igreja, segundo sei, pode ter desempenhado um significado simbólico ou cultural importante para a comunidade, no entanto, a transição para a pedra pode ter a ver com levar o edifício ao seu aspeto original pois, embora eu não saiba muito sobre arte decorativa local, parece-me que o revestimento vermelho era muito recente, nada que se parecesse com as decorações medievais!

Digo eu…

Os jardins meticulosamente cuidados são realmente um convite à meditação. A serenidade é sentida em cada canto do mosteiro, percebendo-se que, mesmo ao ar livre os visitantes se mantinham em silêncio!

E as histórias de sofrimento e destruição continuaram em 1987, embora aquela não seja tradicionalmente uma zona de fortes atividades sísmicas, o mosteiro foi quase destruído por um terramoto que assolou o país.

Felizmente o pior foi evitado e o interior do mosteiro é maioritariamente original, sendo alguns afrescos obra de alguns dos melhores pintores medievais, que vieram de Constantinopla.

Infelizmente as lutas do Mosteiro continuam hoje!

Em 2022 turistas vandalizaram alguns afrescos, escrevendo os seus nomes nas paredes…

Eu nunca entendi qual o interesse de escrever os nomes nos sítios que se visita! Apenas quem o faz sabes de quem são os nomes, ninguém mais conhece as personagens e, além de ser um ato desrespeitoso, se todas as pessoas o fizessem, rapidamente desapareceria toda a história dos povos, por entre riscos de estupidez!

Como dizia o Ministro da Cultura e Informação na época:

“Devemos desenvolver a consciência de que se nós, como indivíduos, não cuidarmos do nosso património cultural, não há instituição, estado ou punição que possa compensar isso”

O pior é que, provavelmente nem foi gente de lá, mas turistas parvalhões de outros países, ansiosos por  publicar bosta no Instagram…

Eu sabia do sucedido mesmo antes de partir de viagem, ao estudar o que procurava ver, mas estes imbecis, certamente, nem se preocupam com a história dos locais, apenas com seus próprios egos inflamados…

Sobe-se a colinha e lá está o cemitério do mosteiro, com uma distribuição curiosa de cruzes, por recantos e socalcos, não sei se organizado de forma hierárquica ou simplesmente por questões de espaço.

Pela localização e pelo ambiente, o cemitério revela-se como um lugar de paz e contemplação. As cruzes, erguidas em diferentes alturas, contam histórias silenciosas de vidas passadas, em placas com fotos e textos que só consegui entender em parte. Pena eu não conseguir lê-las melhor!

Um local onde o tempo parece desacelerar…

A seguir fica a Igreja vermelha da Assunção da Virgem Maria, lá no topo da colina, a seguir ao cemitério.

O mosteiro é continuamente pintado de vermelho desde o século XIII, e muitos historiadores de arte e críticos especulam que é para simbolizar as lutas e as dificuldades do passado

E para quebrar o ambiente profundo e contemplativo que me envolvia, lá em baixo estava aquela que devia ser a casa onde se comia!

Ui, a fome que eu tinha! Agora so tinha de descer aquilo tudo, percorrer as alamendas da entyrada e ir até ali encher- me de comida!

Eu demorara muito tempo nas minhas visitas por isso decidi seguir para Montenegro calmamente.

Tinha mais de 200km para fazer, o meu pulso estava a pedir gelo e eu não me queria arriscar a ter de conduzir apressadamente, sem capacidade de reação rápida, por causa da dor.

Apreciar o caminho é uma das coisas mais fantásticas de uma viagem, não apenas visitar lugares e entrar em sítios!

O rio Lim, o último que eu veria antes de entrar no Montenegro, era algo digno de atenção! Estava a meio gás.

É sempre impressionante quando um rio mostra as suas entranhas assim. Felizmente o outono estava a chegar e em breve começariam as chuvas para o encherem de novo. Esperava eu!

De repente cheguei à fronteira, sem nem dar por ela, já que não tinha fila.

Não havia muita gente na fronteira, cheguei lá quase sozinha, a bem dizer. Isso não me livrou da já celebre pergunta: “Your friends?” nem os livrou a eles da minha tradicional resposta: “No friends, I’m alone!”

Oh, se eu recebesse uma nota por cada vez que me fazem aquele pergunta e a cada vez que eu dou aquela resposta, já teria amealhado um boa quantia!

E cheguei ao alojamento.

Eu sabia que era um parque de campismo e ia preocupada, como nunca me tinha preocupado antes em nenhuma viagem!

E se o acesso ao parque fosse em piso irregular, terra solta ou terra batida em subida ou descida ingreme? Eu sabia que ele era junto ao rio Tapa, num ponto onde o rio ficava centenas de metros abaixo, formando gargantas e canions excelentes para desportos radicais aquáticos.

Quando eu fizera a reserva ainda não tinha tido o acidente e tinha-me parecido um sitio fantástico para dormir, mas agora estava com medo de não conseguir chegar até ele!

Felizmente o caminho desde a estrada até ao parque era uma rua perfeitamente civilizada e alcatroada e havia lá um restaurante simpático e tudo!

Oh alivio!

O meu quarto era uma casinha inteira no meio de um imenso relvado.

Disseram-me para levar a moto até lá…

No momento tremi um pouco de medo, mas depois pensei que, se a tinha estacionado em cima da relva, junto ao mosteiro de Studenica, também conseguiria andar toda aquela distancia até à minha casotinha. Era uma questão de confiar em mim e na minha mão meio inerte…

A minha casotinha era muito fofa.

Caso para dizer que a minha cama ocupava uma casa toda! Não me faltava nada, comi bem no restaurante, bebi um bom vinho, deixei a bolsa de gel no congelador e fui dormir.

Amanhã vou seguir para a Bósnia…

55 – Passeando até à Suiça 2012 – Troyes… ou a cidade das 10 igrejas!

27 de Agosto de 2012

Naquele dia seguiria para norte, como inicialmente previra, antes de mudar os meus planos e desviar-me do meu caminho! Seguiria para a Bélgica mas não sem antes catar todos os recantos de Troyes!

Não foi por acaso que eu decidi pernoitar em Troyes!
Há muito tempo que a cidade estava na minha lista de “imperdíveis”!
Trata-se de uma cidade muito antiga e cheia de habitações e igrejas medievais! Nem eu imaginava quantas!

Passeia-se um bocado pela cidade e parece que em cada esquina há uma catedral! Não é por acaso que lhe chamam “La ville aux 10 églises” (a cidade das 10 igrejas!)

A primeira que procurei, seguindo a sua torre por cima das casas, foi a própria catedral dedicada a São Pedro e São Paulo: Cathédrale de Saint-Pierre et Saint-Paul.

A catedral gótica do séc. XII foi vitima de tudo e mais alguma coisa! Diversos fenómenos naturais e “erros” humanos provocaram momentos de destruição no belo edifício, desde guerras, invasões, tufões, tornados e raios que lhe caíram em cima!

Mas conseguiu chegar até nós linda e de novo a precisar de restauro, que está em curso no momento!

Das coisas mais bonitas no gótico são as “paredes de vidro” onde os vitrais provocam os efeitos mais extraordinários com a luz exterior!

Quem vê a igreja por fora não imagina a sua grandiosidade e beleza interior!

Embora seja um edifício remarcável!

Dá-se-lhe a volta e encontram-se edifícios extraordinários, bem antigos!

E outra igreja gótica, a igreja de Saint Nizier, do séc. XVI. Está meio em mau estado e a clamar por restauro!

O que vale é que, pelo que soube, a cada ano um novo edifício entra em fase de restauro e esta igreja já tem vestígios disso pelos andaimes que estão parcialmente colocados!
Não a pude ver por dentro pois estava fechada!

Segue-se mais um pouco pela rua e encontramos mais uma igreja gótica: a Basilique de Saint-Urbain, do séc. XIII

Começada a sua construção no séc. XIII, demorou 8 séculos mais a ser concluída, porque o dinheiro era pouco. Hoje é dedicada a Saint Urbain, o padroeiro da cidade.

Visitei-a demoradamente por dentro, rodeei-a pelo exterior. As suas gárgulas são curiosas, criaturas humanoides, mais do que monstros.

E há momentos que uma camara capta e que não temos a certeza se foi realmente capaz de o fazer! Momentos de rara beleza e demasiado fugazes para que o olho humano memorize e retenha… Trouxe comigo o voo do passarinho!

E o interior era surpreendente!

Mais uma vez aqueles tetos altos, com paredes iluminadas por vitrais, me fascinaram!

As casinhas em redor, e por todo o lado, parecem irreais e saídas de livrinhos infantis!

Mais à frente fica o centro mais “compacto”, em termos de construções medievais extraordinárias!

Casas lindas, boa parte delas do séc. XVI, em madeira ou com os travejamentos exteriores, casas de estuque e lindas de ficar demoradamente a olhar para elas!

Ruelas estreitinhas, como a “Ruelle des Chats” (Ruela dos Gatos)

E pimba, mais um igreja: a Eglise de Sainte-Madelaine, a mais antiga de Troyes, do séc. XII. Inicialmente em estilo românico e posteriormente, no início do Séc. XIII, remodelada já em estilo gótico que acabava de aparecer na França!

O seu jardim já ganhou o prémio das cidades floridas! Na realidade ele é bonito e original já que os corredores para as pessoas passarem, em vez de serem de terra batida ou empedrados, são relvados!

Do jardim pode-se apreciar a construção em redor!

O interior é extraordinário!

O coro e a abside em gótico flamejante, provocam um efeito de grandiosidade e estranheza!

Fiquei ali a olhar!!

Lá fora as ruelas continuam de regresso à cidade histórica, deslumbrantes!

Para encontrar mais à frente a Eglise de Saint-Jean-au-Marché, gótica do séc. XIII, (igreja de São João do Mercado) porque fica no meio da cidade medieval, onde se faziam grandes feiras!

Não a visitei por dentro porque estava fechada! Na realidade está a ser restaurada aos poucos de acordo com patrocínios que vão sendo angariados…

Pela parte que já está pronta, pode-se ver que deve ser muito bonita e vale a pena preservar!

E vi 5 das 10 igrejas de Troyes, apenas aquelas que “se atravessaram no meu caminho”!

A cidade ficou-me no coração pela beleza antiga que encerra e desejei voltar a visita-la de novo um dia!

Entretanto segui o meu caminho pela França profunda, como eu gosto de chamar à imensidão dos campos e searas sem fim, até Reims!

(continua)

14 – Passeando até à Suiça 2012 – Aosta – Monstreux – Sion

7 de Agosto de 2012 – continuação da continuação!

Então o resto do dia foi mais um “andar para a frente e para trás” espetacular!

Aosta é uma cidade muito interessante, mesmo pertinho do Tunel du Mont Blanc (um túnel que nunca quis fazer de moto, cruzes!). a cidade está cheia de vestígios romanos e é a capital do belissimo Vale de Aosta (que ainda hei-de visitar em pormenor, um dia que esteja menos calor!)

A Collegiata di Sant’Orso é um conjunto do séc. XI que quero visitar mais calmamente, pois é extraordinário e diferente do que se construiu por cá na mesma época.

Naquele dia estava fechada e apenas pude visitar o espaço de culto, pois o claustro estava fechado, o que foi um oásis de frescura junto dos quase 40º grau que se faziam sentir lá fora!

Curioso que, no altar tem uma “janela” no chão que nos permite ver um mosaico do sec XII por baixo, que foi descoberto apenas há 12 ou 13 anos!

O mais bonito (e mais fresco) foi a cripta, que tem sempre um efeito curioso sobre mim! Normalmente é a parte mais antiga de uma igreja e este deve ser da época do mosaico, sec. XII.

Se pensarmos que é do tempo da fundação da nossa nacionalidade!
Lindo!

E voltei para o calor infernal e para as ruas pitorescas e cheias de gente!

Encontra-se este tipo de esculturas também pela Suiça, quando têm de derrubar uma árvore, fazem por vezes com o seu tronco ainda ligado à terra, esculturas que resultam parecidas com tótemes, muito giras!

Estão em escavações sob a Porta Pretoria, a porta da cidade romana que se chamou Augusta Praetoria Salassorum, e que foi construi da no ano 25 aC!

A gente passa pela porta e assiste aos trabalhos de varanda!

Ali ao lado fica o teatro romano, onde havia também um anfiteatro, o que faz da cidade romana uma grande e extensa cidade de grande importância!

O calor estava a torrar-me os miolos, mesmo com o chapéu! Eu não iria mais longe… Aosta lá ficará para quando eu voltar, esperando que o calor seja menos sufocante!

Devia ter feito como os chinocas fazem que visitam as cidades de guarda-chuva, assim o sol não chegaria com tanta força até mim!
O glaciar, lá ao longe, por cima das casas, estava a chamar-me para o fresquinho!

Voltei para a moto, por ruas muitos giras, cheias de artesanato e souvenirs.

E voltei ao paraíso! Lá em cima estava uma temperatura agradável, comparada com o calorão de Aosta, cerca de 24º, o que resultava fresquinho!

A festa tinha acabado e, se não tivesse estado nela, nem perceberia que tinha sequer existido! Reinava a paz e o sossego por ali!

Então fui visitar o Hospice de St Bernard por dentro.

Ali foram recebidos peregrinos e viajantes que atravessavam de ou para Itália, pois o caminho (Pass) é a distancia mais curta entre os 2 países!

Napoleão passou por ali em 1800 com as suas tropas a caminho de Itália, por isso há quem lhe chame rota imperial.

Lá dentro os espaços religiosos são bonitos e típicos da época, a igreja com decoração barroca é dedicada a Saint Nicolas.

Cá fora, patinhas amarelas de São Bernardo guiam-nos para caminhos a percorrer, muito giras! Claro que tirei uma foto à minha Magnífica junto à placa, para memória futura! (as patinhas amarelas vêm-se no chão junto à moto)

E desci o Pass…

Há dias cheios de beleza e que ainda por cima parecem nunca mais acabar!

Quando desci do St Bernard Pass o sol estava tão alto e ainda faltava tanto para anoitecer, que pus-me a pensar “como é que eu já fiz tanto e ainda tenho tanto tempo para mais?”

Perguntei ao meu Patrick o que havia por ali perto para eu ver, antes de voltar lá para baixo e ele “falou-me” de um lago: Champex-lac em Verbier – St Bernard! (quem inventou o GPS deverá ter direito ao céu!)

Aquele nome não me era estranho, tinha ideia que era coisa bonita… bem por ali acho que tudo é bonito! E lá fui!

O lago é bonito e havia gente relaxadamente na relva junto à água, onde me fui estender também, não sem antes comprar algo fresco para me acompanhar. Uma escultura curiosa de um coelho humanoide olhava para nós, dentro da água.

Pus-me a brincar com os miúdos, tirei as botas e fui chapinar na água com eles! Eheheh

Continuava a ser dia claro quando voltei à estrada. A descida parecia uma linha num bolso, na imagem do GPS!

Pelo GPS faltavam 3 horas para o sol se por, por isso decidi ir vê-lo a um lugar muito especial, daria tempo, porque naquele pais é tudo perto!

Passei por muitos motociclistas simpáticos e cordiais que circulavam perfeitamente ordenados! Muito bem!

Passei por carros “especiais de corrida” que por ali existem em número remarcável!

Passei pelo Château d’Aigle, do sec. XII, onde hoje funciona o Museu da Vinha e do Vinho.

Mas eu só queria rodeá-lo e aprecia-lo de todos os ângulos, porque é lindo!

Chama-se Castelo da Águia porque fica numa comuna que se chama mesmo Águia

E continuei até Montreux! Era ali que eu queria ir ver o sol descer!

Junto à cidade de Montreux há uma pequena estrada que sobe o monte, até perto de um rochedo que fica lá no topo, le Rochers-de-Naye!

Encontrei o caminho com uma facilidade espantosa e comecei a subi-lo e a fotografar cada etapa da subida!

O Lac Leman consegue fascinar-me em qualquer ângulo, mas naquele dia deixou-me em êxtase!

Cheguei ao fim do caminho e fiquei ali, a olhar…

O rochedo fica mais acima um bom bocado, mas só se pode aceder a ele depois de uma longa caminhada quase a pique! Não era coisa para mim e, o que via dali para o lago… era suficiente deslumbrante!

Há placas indicativas para os caminhantes informando dos trilhos

Mas eu fiquei ali, quieta, mais a minha Magnifica, a deslumbrar-me apenas…

Ainda olhei para trás na descida, o rochedo esta ali, tão perto!

Mas a beleza que eu procurava estava para baixo, não para cima!

E o sol ainda não se pusera!

Decidi descer e vir cá abaixo vê-lo do nível das aguas, assim não teria de descer às escuras!

Agora entardecia mais rapidamente!

Fui passear para junto do Château de Chillon, o castelo mais emblemático da Suíça e um dos mais conhecidos do mundo.

Foi construído sobre um rochedo no lago por isso este faz de fosso para o castelo!

Construído no séc. XII, mas com antecedentes bem mais antigos que podem ser visitados no seu interior.

Visitei-o há muitos anos, agora o que eu procurava não era vê-lo por dentro (até porque já estava fechado)! Eu queria vê-lo por fora com o lago e o pôr-do-sol…

Deslumbrante!

Então acabei o meu dia numa corrida até Sion onde fiz uma festa com os amigos que fizera na pousada de juventude, a que se juntou um grupo de motociclistas holandeses que iriam descer, no dia seguinte, até Nice, o caminho inverso ao que eu fizera dias antes.

Fizeram todo um espanto por eu andar por ali sozinha com uma moto tão grande! Nem queriam acreditar onde eu iria a seguir!

Fim do nono dia de viagem!

11 – Passeando até à Suiça 2012 – de Thonon-les-Bains até Sion

*
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6 de Agosto de 2012

E a manhã estava ruim! Havia nesgas de sol para um lado e nuvens monstruosas para o outro. Quando não há tempo melhor temos de sair com o que temos! A distância que tinha de percorrer não era muito grande, bastava não me perder a visitar muita coisa e chegaria facilmente e cedo a Sion… Acabei por seguir ao sabor do tempo!

Por isso lá fui como as moscas atrás da luz, tentando evitar as nuvens mais negras, mas era certo que iria apanhar uma molha, mais aqui ou mais ali!

Eu costumo dizer que me chateia para caramba andar a passear o fato de chuva pela Europa! Se o levo comigo que seja para usar! E a oportunidade de o voltar a usar aproximava-se a cada quilómetro!

Acabei por passar em Megève, uma cidade alpina que apenas conhecia cheia de neve e de gente famosa. Foi ali, há muitos anos que me cruzei com o George Michael, numa noite cheia de neve e luzinhas, em que parecia que estávamos todos no meio de um filme infantil de Natal!

Desta vez foi a chuva que me recebeu e aquilo tudo era tão diferente sem neve!!

Mal reconheci a praça onde eu já passara de skis nos pés!

Chovia tanto que me enfiei num café e fiquei ali, a tomar café (de litro) e a conversar, esperando que a chuva abradasse… mas tive de seguir mesmo assim ou passaria ali o dia!

A paisagem envolvente seria bem mais bonita se não chovesse, tenho a certeza, pois todas aquelas montanhas são deslumbrantes cobertas de neve, no verão serão forradas a verde e igualmente deslumbrantes!

Acabei por passar em Chamonix e entrar no Valais por Matigny! Nada se via do Mont Blanc, era como se ele tivesse tirado férias e nada houvesse no seu lugar! O longo vale só se tornou visível a partir de uma certa altitude para baixo, quando passei a cortina das nuvens densas para descer para Martigny!

Lá ganhei coragem e puxei da máquina fotográfica, que estava bem escondida dentro do blusão, para tirar uma ou duas fotos!

Mas a chuva não queria mesmo foto nenhuma! Agua e máquinas não dão nunca o casamento perfeito!

Ao ver pingos de água na lente desisti, não valia de nada andar por ali a arriscar afogar uma nova maquina, por isso fui direta à pousada de juventude de Sion disposta a ficar quieta e amuada por lá até a chuva parar!

Pus as minhas coisas a escorrer, puxei do computador e dispus-me a viajar pela net, enquanto o tempo não me permitisse viajar de moto!

E a chuva parou!

Voltei a sair, mais leve e mais bem-disposta!

Sion é a cidade mais antiga da Suíça e um dos locais pré-históricos mais importantes da Europa, pois ali há vestígios de ocupação humana que remontam a 6.200 aC!

Para mim bastava-me ver de perto os seus dois castelos! Na realidade é um castelo e uma basílica fortificada que ficam no topo das duas colinas contiguas, quase no centro da cidade!

Mas eis que voltou a chuva!

A pé não há qualquer problema, fui a um supermercado e comprei um guarda-chuva! Sem fotos é que eu não iria ficar!

E lá fui procurar o caminho para os castelos!

É sempre uma sensação curiosa pisar caminhos medievais para mim!

Chegando verdadeiramente ao início das subidas há que decidir se vamos para o château Valère (a basílica), ou para o castelo Tourbillon! Como o castelo me parecia mais uma série de muros e fica atrás da abadia, em relação à cidade, decidi-me pela abadia, o château Valère, que isto de subir a um e depois a outro estava fora de questão! Gosto de ver mas não gosto de subir, que dá-me cabo das pernas e depois custa conduzir!

A meio da subida a chapelle de Tous les Saints, do séc. XIV, linda!

O castelo na outra colina tornava-se numa paisagem muito bonita, com as vinhas pela encosta! Certamente a paisagem vista do castelo não seria tão bonita porque a basílica (deste lado) estava em obras e tinha uma parte envolvida em panos! Por isso eu fiz a boa escolha! 😀

Ao chegar lá acima, em espaço aberto, a paisagem era deslumbrante! Não só porque é linda mas também porque o sol voltava a espreitar por entre as nuvens e provocava o tal efeito que me fascina depois da chuva!

Para trás de mim o castelo e a capela completavam o quadro!

Fiquei ali deslumbrada a deslumbrar-me com o que os meus olhos viam e a minha máquina captava!

Mas ainda não tinha chegado ao topo, a basílica ficava mais acima!

Entrei finalmente nos seus domínios!

A basílica de Valère foi construída entre os séc. XII e XIII como uma igreja fortificada, comuns na época, por isso lhe chamam castelo.

Lá de cima tudo é deslumbrante!

As vinhas, na encosta, com o sol tangente, pareciam resplandecer!

A cidade aos meus pés e o longo vale a seguir!

O aeroporto internacional, mais à frente

A basílica, que não dá para ver de perto pois está embrulhada para obras!

Dentro há uma segunda zona fechada, ouviam-se as pessoas a rezar lá dentro, por isso nem tentei entrar!

Naquele dia o deslumbramento estava cá fora, por isso fui-me embora dali.

O vale é deslumbrante visto de lá de cima, para o outro lado também!

O sol desaparece mais cedo quando estamos entre montes muito altos!

Voltei a descer à cidade que tinha mais 2 ou 3 coisas que eu queria ver…

para além dos caminhos pitorescos típicos de uma cidade medieval!

Como a Cathédrale de Notre-Dame du Clavier, uma construção lindíssima que tem origem lá pelo séc. VIII, numa pequena igreja carolíngia posteriormente alterada no séc. XI, e chega até nós com as proporções e beleza góticas, mantendo o campanário românico.

Logo ao lado fica a Eglise de Saint-Theodule, também gótica, muito menos interessante mas cheia de história, já que é dedicada ao primeiro bispo de Sion, lá pelos anos 500, que abençoa as vinhas do Valais!

Tinha umas esculturas de plástico, ou fibra de qualquer coisa, à porta que davam um ar bizarro ao conjunto!

Em redor das duas igrejas fica o centro histórico e as ruelas mais estreitinhas

Deve ser curioso viver-se sobre um canal! Por aquelas terras é mais ou menos comum, dado que tem de se escoar as águas do degelo!

E fui para a pousada, onde a paisagem era uma casa no meio da vegetação. Se alguém me dissesse que vivia numa casa cor-de-laranja com venezianas roxas eu pensaria que era louco, mas afinal até fica bem o conjunto!

Bebi uma Super Bock, que na Suíça é mais barata que muitas outras cervejas (e melhor), e fiz amigos para conversar e passar parte do serão!

Fim do oitavo dia de viagem..